Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
DEMANDA TRANSFUSIONAL DURANTE EPIDEMIA DE DENGUE NO DISTRITO FEDERAL EM 2024: CONDUTA RESTRITIVA É UMA REALIDADE?
Abstract
Introdução: O manejo transfusional dos pacientes com dengue é um desafio para as equipes médicas e bancos de sangue. A transfusão profilática de plaquetas não previne o sangramento ou acelera a recuperação plaquetária em pacientes adultos, devendo ser desencorajada. Contudo, evidências mais robustas são necessárias para pacientes pediátricos ou adultos com dengue severa. Já na presença de sangramento, as evidências ainda são insuficientes para comprovar ou não o benefício da transfusão. Em geral, realiza-se transfusão profilática com contagens de plaquetas < 10.000/mm3 e terapêutica em casos de sangramentos graves. No contexto de uma epidemia essa situação fica ainda pior. Em 2024 a população do Distrito Federal (DF) vivenciou uma epidemia de dengue sem precedentes. Segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, de 28/05/24, foram 258.650 casos prováveis e 381 óbitos desde 01/01/24. Objetivos: Analisar a demanda transfusional durante os meses de epidemia de dengue no DF. Materiais e métodos: Realizada análise retrospectiva dos prontuários dos pacientes com diagnóstico de dengue, internados nos hospitais atendidos pelo Banco de Sangue do Grupo GSH no DF, de 01/01/2024 a 31/05/2024. Os dados foram comparados com a média de transfusão no ano e do mesmo período de 2023. Resultados: Tivemos no período analisado 8790 transfusões de hemocomponentes, média de 293 transfusões/mês, maior que a média do ano de 2023 (229,4) e do mesmo período de 2023 (263,4). Dessas, 1759 (20%) foram para 172 pacientes com dengue, dos quais 123 (71,5%) apresentavam comorbidades e 67 (38,9%) tiveram sangramentos. As principais comorbidades foram HAS (26%), neoplasias (17,9%) e cardiopatias (13,8%) e os principais sangramentos foram HDA/HDB (38,8%), epistaxe/gengivorragia (13,4%), petéquias/equimoses (10,4%) e hematúria (8,9%). Dentre os pacientes, 69 (40%) receberam transfusão de hemácias e 102 (60%) de plaquetas. Dos que receberam plaquetas 36% tinha contagem abaixo de 10.000, 32% entre 10.000-20.000 e 24% entre 20.000-50.000. Quando correlacionamos a ocorrência de sangramento a contagem plaquetária temos que 84% dos pacientes com sangramentos tinham plaquetas < 50.000, sem diferença entre os grupos. Contudo, quando excluímos os sangramentos grau I (WHO) observamos uma tendência a maior incidência em pacientes com contagem de plaquetas entre 20.000-50.000. Discussão: O nosso estudo corrobora os dados da literatura sobre a ausência de uma correlação direta entre a contagem plaquetária em pacientes com dengue e a ocorrência de sangramento. A tendência a maior incidência de sangramentos graves em pacientes com plaquetas entre 20.000-50.000 pode ser reflexo da população estudada, com alta prevalência de comorbidades ou ao pequeno grupo de estudo, sendo necessárias outras análises para avaliar o significado desse achado. Contudo, chamou atenção o aumento da demanda transfusional no período, com necessidade de suporte de plaquetas por outras regionais e a dificuldade das equipes médicas em adotar uma conduta mais restritiva nessa população. Conclusão: Mais estudos com essa população são necessários para dar suporte as equipes na tomada de decisão. Até lá, uma abordagem multiprofissional, envolvendo as equipes assistenciais e de hemoterapia é primordial nesses períodos, para evitar o desabastecimento dos bancos de sangue e garantir o suporte transfusional a todos os pacientes.