Jornal de Assistência Farmacêutica e Farmacoeconomia (Nov 2024)

ID264 Aspectos gerais dos fluxos temporais da judicialização para o uso da terapia gênica (TG) para AME no Brasil e suas regiões: dados preliminares

  • Ney Boa Sorte,
  • Adriana Galindo,
  • Michelly Pereira,
  • Simone Barreto,
  • Lélia Carvalho,
  • Lívio Oliveira,
  • Juliana Gianetti

DOI
https://doi.org/10.22563/2525-7323.2024.v9.s1.p.203
Journal volume & issue
Vol. 9, no. s. 1

Abstract

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Introdução Em 2019, os gastos do Governo Federal no Brasil com a judicialização da saúde ultrapassaram 1,3 bilhão de reais. Desse montante, as doenças raras (DRs) responderam por 90% do que a União gastou com processos judiciais (PJ) para acesso a medicamentos. Em 2019, a nusinersena, posteriormente incorporada ao SUS para o uso em AME tipo 1, foi responsável pelo 2º lugar entre os 10 maiores gastos. Nos últimos dois anos, o onasemnogeno abeparvoveque, após aprovação na ANVISA em 2020, assumiu um lugar na lista de medicamentos mais judicializados, sendo necessário caracterizar esse processo para melhor compreensão do fenômeno. Métodos Estudo retrospectivo longitudinal, com dados preliminares obtidos a partir de 177 PJ que notificaram a União para solicitação de uso da terapia gênica para AME. Foram avaliados dados referentes aos tempos decorridos entre o nascimento, realização do exame molecular, resultado final, relatório médico, início do processo judicial, deliberação final, uso do medicamento. Os dados foram comparados entre as regiões N/NE/CO e SE/S e segundo o ano de nascimento das crianças. Resultados Os dados preliminares mostram que 97,1% dos PJ foi iniciado após 2020, predominantemente em 2021(42,9%). Até o momento desta análise, 83,6% dos PJ tinham deferimento, dos quais, em 89,2%, o MS foi notificado para o fornecimento da TG. Em média(DP), a idade das crianças no início do trâmite judicial foi de 13,3(10,7) meses, variando desde a vida-intrauterina (um caso) até 62 meses(5,2 anos). Houve um incremento não significante na idade da criança no início do PJ (B=26,9;p=0,399) de cerca de 30 dias a cada ano (2019-2022). Observou-se, em média[DP] uma menor idade da criança no início do PJ nas regiões N/NE/CO comparadas as regiões S/SE (11,1[7,9] vs. 14,7[11,9] meses;p=0,019). Dentre as crianças residentes no N/NE e no CO, respectivamente, 54,5% e 50,0% tiveram o primeiro relatório médico emitido por profissionais da região SE/S. O tempo, em média[DP], de realização do exame confirmatório foi menor para os residentes nas regiões N/NE/CO (176,2[132,5] vs. 247,8[224,4];p=0,022), mas não o tempo para a liberação do resultado (18,6[16,7] vs. 16,1[12,1];p=0,363). Em média(DP), as decisões finais dos PJ ocorreram com as crianças em idade de 17,9(11,2) meses, variando de 1,2 a 57,7 meses. Até 6 meses de idade, 13,6% das decisões foram finalizadas, e acima de 24 meses de idade, 17,9%. Não houve diferença na média de idade da criança ao tempo da decisão judicial segundo região(p=0,252). O tempo mediano[p25-p75] de tramitação foi mais elevado nas regiões N (98[77-282] dias;p=0,021) e S (162[68-372];p=0,026), quando comparadas ao SE (76,5[25-162]), região com menor percentual de solicitação de perícia(34,2%). Em média (DP), as infusões da terapia foram realizadas na idade de 18,2(10,7) meses, sem diferenças entre as regiões N/NE/CO e SE/S (p=0,973). Discussão e conclusões Os dados preliminares revelam um aumento da judicialização no momento de aprovação da TG pela ANVISA, em 2020, com as crianças ainda no 1º ano de vida. Destaca-se, paradoxalmente, uma menor idade das crianças nas petições judiciais de residentes do N/NE/CO, bem como o achado de que mais da metade de relatórios médicos das crianças residentes no N/NE foram emitidos por profissionais das regiões SE e S. Achados similares já foram descritos no processo de judicialização para a terapêutica de mucopolissacaridoses no Brasil e podem ser um indicador de desigualdade e elitização do acesso (Medeiros et. al.,2013).