Saúde e Sociedade (Mar 2012)

Cidadania médica, culturas e poder nos cuidados perinatais e pediátricos de imigrantes Medical citizenship, culture and power in perinatal and pediatric immigrant care

  • Elizabeth P. Challinor

DOI
https://doi.org/10.1590/S0104-12902012000100009
Journal volume & issue
Vol. 21, no. 1
pp. 76 – 88

Abstract

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Através de uma descrição detalhada das consultas médicas de mães Cabo-Verdianas, estudantes em Portugal, observadas ao longo de dois anos de trabalho de campo, este artigo pretende elucidar as relações de poder inerentes na institucionalização da biomedicina em que as diferenças culturais são ignoradas, mal-entendidas e criticadas, oferecendo uma análise crítica sobre o princípio de tratamento igual para todos. A observação das consultas médicas faz parte de uma abordagem metodológica mais abrangente de acompanhar mães nas suas consultas com assistentes sociais e oficiais da imigração e de realizar entrevistas semi-estruturadas com as mulheres sobre as suas experiências de maternidade. A etnografia revela não só as limitações de uma política de um universalismo cego que nega as diferenças em nome do humanismo e dos direitos universais como revela a necessidade de se fazer uma distinção conceptual entre "literacia no domínio da saúde" (LDS) e "literacia dos sistemas de saúde" (LSS). Ao demonstrar como a biomedicina não pode ser separada do contexto cultural no qual é praticada, o artigo argumenta que o objectivo de promover a LSS de imigrantes, conhecedores de outras abordagens e sistemas de saúde, devia ser considerado como uma estratégia mais ampla de promoção de competência intercultural que visa ajudar tanto os médicos como os pacientes. Evitar utilizar o termo LDS que implicitamente rotula imigrantes como "analfabetos", é uma forma de valorizar as suas culturas, práticas e interesses alternativas em matéria de saúde e de ajudar a dissolver a hierarquia dos saberes entre médicos e pacientes imigrantes.Through detailed ethnographic descriptions of Cape Verdean student migrant mothers' encounters with the Portuguese health system, based on two years of fieldwork, the aim of the paper is to elucidate the power relations inherent in institutionalised medical encounters through which cultural differences are ignored, misconstrued and criticised in order to provide a critical reflection upon the principle of equal, universal treatment for all. The observation of medical encounters constitutes part of a broader methodological approach of accompanying the mothers to appointments with doctors, social workers and immigration officials, as well as conducting semi-structured interviews with the women upon their experiences of motherhood. The ethnography not only highlights the shortcomings of a policy of blind universalism which denies difference in the name of humanism and human rights but also reveals the need to make a conceptual distinction between "health literacy" and "health systems literacy". By demonstrating how biomedical knowledge cannot be separated from the cultural context within which it is practised, the paper argues that promoting the systems literacy of immigrants who are literate in alternative health approaches and systems should be regarded as part of a wider strategy to increase the intercultural competency of doctors and patients alike. Refraining from using the term "health literacy" which implicitly labels immigrants as "illiterate", acknowledges their cultures and alternative health practices and concerns and contributes towards dissolving the knowledge hierarchies between doctors and immigrant patients.

Keywords