Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
MORTE ENCEFÁLICA EM LEUCEMIA PROMIELOCÍTICA RECIDIVADA
Abstract
Introdução: A leucemia promielocítica aguda (LPMA) representa 5 a 20% das leucemias mieloide aguda, sendo causada pela mutação t(15;17), produzindo a proteína PML-RARA, a qual interfere no metabolismo celular. A LPMA tem como diferencial dos demais subtipos a alta mortalidade precoce associada a sangramentos. Objetivo: Relatar o caso de uma paciente que evoluiu com segunda recaída em medula óssea (MO), porém indo a óbito por morte encefálica devido complicações de uma leucemia promielocítica recidivada. Relato de caso: Adolescente do sexo feminino, 18 anos, procedente de Dourados, MS, com diagnóstico de LMA M3 em 2018. Realizou protocolo PETHEMA, com recaída em outubro de 2021 em Sistema Nervoso Central (SNC) e MO, sendo então associado trióxido de arsênico e posteriormente transplante de células tronco hematopoéticas (TCTH) autólogo, seguindo acompanhamento com mielograma e quantificação de PML-RARA. Todavia, em junho de 2023 viajou para a Serra Gaúcha com sua família, quando iniciou com diversos hematomas pelo corpo associado a sangramento gengival espontâneo. Em seus exames iniciais, observou-se pancitopenia, sendo internada em hospital terciário. Nova imunofenotipagem de MO foi compatível com LMA M3 com 83,4% de acometimento. Dessa forma, optou-se pela realização de tretinoína (ATRA), enquanto aguardava compra do trióxido de arsênico. Contudo, durante a internação, a paciente apresentou neutropenia febril com foco pulmonar, tendo necessidade de intubação orotraqueal e antibioticoterapia. Iniciado corticoide devido possível síndrome do ATRA, posteriormente havendo melhora dos parâmetros pulmonares. Evoluiu com piora neurológica, com tomografia de crânio evidenciando hemorragia intracraniana extensa, com midríase fixa e ausência de reatividade supraespinhal. A complementação diagnóstica foi compatível com morte encefálica. Discussão: A fisiopatologia da LPMA baseia-se na produção errônea da proteína PML-RARA, a qual bloqueia a diferenciação celular ao mesmo tempo em que previne a apoptose e permite a proliferação de progenitores leucêmicos. A coagulação intravascular disseminada (CIVD) é a principal complicação aguda da LPMA que, quando não tratada a tempo, evolui com sangramento pulmonar e/ou cerebral em até 40% dos pacientes. Por esse motivo, assim que houver achados suficientes para o diagnóstico presuntivo, a tretinoína deve ser iniciada para induzir a maturação celular e tentar frear a coagulopatia. Quando o diagnóstico de certeza for firmado, deve-se iniciar o tratamento pleno com o uso de quimioterápicos associados. Nos pacientes refratários, o ATRA pode ser repetido com o uso de trióxido de arsênio como resgate, idealmente seguido com TCTH. O gentuzumabe ozogamicina também pode ser utilizado quando disponível. Conclusão: Apesar da LPMA ter um curso clínico sombrio quando não identificada precocemente, os esquemas terapêuticos possibilitam uma taxa de cura significativa, com 98% de sobrevida sem doença em grupos de baixo risco. Por conseguinte, após o controle da doença, devemos atentar para possíveis recidivas tumorais, já que podem se apresentar como episódios de sangramento fatais.