Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
RELATO DE CASO: MANEJO DE HEMÓLISE EXTRAVASCULAR EM TRATAMENTO DE HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA COM INIBIDOR DO COMPLEMENTO ANTI-C5
Abstract
Objetivo: Relatar manejo terapêutico de hemólise extravascular consequente ao uso de Eculizumabe em paciente portador de Hemoglobinúria Paroxística Noturna. Material e métodos: Os dados foram obtidos a partir de entrevista e revisão de prontuário, com autorização do paciente. Relato de caso: Paciente masculino, 52 anos, encaminhado à Hematologia do Hospital de Base de São José do Rio Preto devido astenia, perda de peso involuntária, urina escurecida há 7 meses e hemograma com presença de pancitopenia. Exames laboratoriais de investigação apresentavam reticulocitose, DHL elevado e Coombs direto (CD) negativo. Realizada imunofenotipagem por citometria de fluxo com pesquisa do clone da hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), com evidência de perda de C59 parcialmente em 13% das hemácias e total em outros 18%, perda da expressão de C59 em 90% dos granulócitos e dos monócitos, confirmando o diagnóstico. Até a introdução do tratamento específico, paciente necessitava de transfusão de cerca de um concentrado de hemácias ao mês. Após início do Eculizumabe, paciente interrompeu necessidade transfusional e obteve significativa melhora hematimétrica. Ao longo dos dois primeiros anos de tratamento, apresentou irregularidade nas infusões devido interrupções no fornecimento da droga. Após esse período, retomou uso regular da medicação, porém, persistiu com redução de níveis de hemoglobina (Hb) associada a reticulocitose e DHL elevado, evoluindo novamente necessidade transfusional. Solicitado novo CD, com resultado positivo. Assim, foi aventada a hipótese de hemólise extravascular (HEV) associada ao uso de inibidor do complemento anti-C5. Visto indisponibilidade de inibidores proximais da via do complemento, foi reiniciada Prednisona 1 mg/kg/dia e observou-se melhora persistente de Hb e das provas de hemólise após 4 meses. Desmame de corticoterapia foi realizado, sem evidência de recorrência de hemólise até o momento, com controle adequado de hemólise intravascular (HIV) e extravascular. Discussão: A HPN é uma doença rara que ocorre por alteração uma alteração clonal derivada da mutação do gene PIG-A, com consequente destruição da enzima glicosilfosfatidilinositol (GPI), responsável pela produção e ancoramento das proteínas CD 59 e C55 na superfície eritrocitária. Sem elas, as hemácias tornam-se suceptíveis à HIV pelo complemento. Sintomas incluem: dor abdominal, disfunção renal, hemoglobinúria, disfagia e eventos tromboembólicos. Atualmente, a terapia padrão-ouro é a inibição de complemento terminal (anti-C5). No Brasil, o Eculizumabe é a principal linha de tratamento. Porém, efeitos adversos relacionados à inibição distal do complemento são descritos, como por exemplo a HEV, visto que, com o bloqueio do C5 na via distal, há tendência de acúmulo de C3b na superfície eritrocitária, o que ativa a captação dessas células pelo sistema reticulo-endotelial. Nesse caso, ocorre hemólise a despeito do uso correto da medicação. Laboratorialmente, é encontrado CD positivo com isolado de C3b. O tratamento atual recomendado envolve o uso de inibidores proximais da via do complemento, porém, em sua indisponibilidade, pode ser realizada corticoterapia e esplenectomia em casos refratários. Conclusão: A hemólise extravascular associada ao uso do eculizumabe é uma complicação possível e encontrada em até 50% dos casos. A elevação de provas de hemólise frequentemente é confundida com atividade da doença e pode atrasar diagnóstico e tratamento corretos.