Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (Nov 2022)

Ninguém nasce com micose

  • Ana Paiva,
  • Ana Luísa Silva,
  • Maria João Cruz

DOI
https://doi.org/10.32385/rpmgf.v38i5.13365
Journal volume & issue
Vol. 38, no. 5

Abstract

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Introdução: O mau alinhamento congénito ungueal do hálux carateriza-se pelo desvio lateral do prato ungueal, com consequente hiperqueratose e distrofia ungueal. Sem etiologia completamente esclarecida, reconhecem-se causas genéticas e fatores extrínsecos, tais como microtraumatismos recorrentes. Esta condição é frequentemente mal diagnosticada e tratada como onicomicose. Comummente, este desvio está presente desde o nascimento, surgindo alterações ungueais habitualmente nos primeiros anos de vida. Na maioria dos casos, verifica-se apenas um desvio ligeiro que pode passar despercebido até à infância tardia/puberdade, quando ocorrem alterações ungueais marcadas resultantes de stress mecânico. Os casos sem distrofia significativa não carecem de intervenção. Nos restantes, está indicado o tratamento conservador com formulações tópicas de ureia. Descrição do caso: Menina de 7 anos, previamente saudável, foi referenciada à consulta de Dermatologia pela Médica de Família por “onicomicose das unhas dos háluxes” refratária a tratamento com antifúngicos tópicos nos últimos 18 meses. Ao exame objetivo, apresentava unhas de coloração amarelo-acastanhada e hiperqueratose com distrofia de ambos os háluxes, valgismo bilateral dos primeiros dedos e distrofia ungueal dos segundos dedos dos pés, sem sinais inflamatórios. A menina apresentava alterações ungueais desde o nascimento, sem história de trauma, e o pai apresentava um quadro idêntico, também resistente ao tratamento com antifúngicos, desde há vários anos. Foi assumido o diagnóstico de distrofia ungueal secundária ao mau alinhamento congénito ungueal dos háluxes. Recomendou-se a aplicação de um creme de ureia e raspagem das unhas de acordo com o conforto da criança. Comentário: O conhecimento desta entidade permite estabelecer um correto diagnóstico, evitando tratamentos desnecessários e possíveis efeitos adversos. Sublinha-se a importância de uma história clínica cuidada, com destaque para o início do quadro clínico e a existência de quadros semelhantes na família. A aparência ungueal dismórfica desde o nascimento ou primeira infância deverá alertar para uma condição diferente de onicomicose, sendo esta infrequente em idades tão precoces.

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