Jornal de Assistência Farmacêutica e Farmacoeconomia (Feb 2023)
Uso medicinal da cannabis no Brasil: o instituto do fumus boni iuris garantindo o direito a saúde
Abstract
Introdução: Há situações clínicas em que os medicamentos disponíveis são ineficazes, ocorrendo a prescrição de drogas importadas e/ou não registradas na Anvisa. O canabidiol (CDB), substância presente no óleo da Cannabis sativa conhecida popularmente como maconha, é um destes produtos que vem sendo atualmente utilizado para diversos fins terapêuticos. Devido a fatores econômicos, legais e sanitários pacientes e/ou familiares vem buscando a justiça para garantir o direito a importar sementes, cultivar a planta Cannabis sativae extrair o seu óleo, rico em CBD, para uso terapêutico em diversas condições clínicas, que vem proferindo decisões amparadas pela fumus boni iuri. Objetivo: Caracterizar a judicialização da cannabis para uso medicinal no Brasill entre 2016 e 2019, quanto à instância judicial, local, ano da sentença e patologia. Métodos: os dados foram coletados das sentenças disponíveis no Portal JusBrasil bem como de outras fontes secundárias como portais de notícias. Resultado: foram encontradas 17 sentenças proferidas pela justiça federal autorizando o cultivo da cannabis para fins medicinais, sendo 16 sentenças individuais e 1 coletiva. Nas ações individuais os pacientes tinham diagnostico de adenoma cerebral hipofisário, síndrome de Silver Russel, autismo, epilepsia, hérnia de disco, depressão, Parkinson, síndrome de West, síndrome de Dravet, retinose pigmentar e dor neuropática, sendo 9 pacientes com idade entre 4 e 16 anos, 5 com idade entre 32 a 60 e 3 com idade indeterminada. As sentenças foram proferidas pelos Tribunais Federais dos estados do Acre, Bahia, Ceará, Paraíba, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e do Distrito Federal. Conclusão: ao ser provocado, o Poder Judiciário, instituído pela fumaça do bom direito, vem quebrando barreiras legais para garantir o direito à saúde. Chama atenção para o fato que as decisões também abordam aspectos sanitários tais como: número de plantas autorizada ao cultivo, posologia do uso, declaração de instituições científicas sobre a possibilidade de uso de seus laboratórios para parametrização do medicamento produzido, já apontado contornos para uma futura regulamentação legal e sanitária. Em 2015 a Anvisa retirou o CBD da lista de substâncias proscritas e a incluiu na lista de controle especial, e mais recentemente aprovou a realização de duas consultas públicas relacionadas à regulamentação do cultivo controlado de cannabis sativa para uso medicinal e científico e do registro de medicamentos produzidos com princípios ativos da planta. Com isso abre-se espaço para a sociedade na construção de uma regulação clara, transparente, que atenda aos interesses dos pacientes sobre o cultivo da cannabis para uso medicinal e até mesmo para a inserção de medicamentos à base de canabióides no SUS.