Jornal de Assistência Farmacêutica e Farmacoeconomia (Feb 2023)
Análise das incorporações de medicamentos para doenças raras no Brasil: é possível acesso integral a esta minoria?
Abstract
Introdução: No Brasil, o Ministério da Saúde estabelece como doença rara aquela que possui prevalência abaixo de 65 a cada 100.000 pessoas. Este termo coletivo – doenças raras – é utilizado para incluir um grupo muito heterogêneo de distúrbios que podem afetar qualquer sistema do organismo. Tendo em vista o Sistema Único de Saúde (SUS) e seus princípios Integralidade, Equidade e Universalidade, os pacientes acometidos com alguma doença rara representam uma parcela importante da população apesar de serem minoria por definição. OBJETIVO: Descrever o perfil de solicitações de incorporação de medicamentos no âmbito de doenças raras enviadas à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (CONITEC) e suas recomendações, comparando os critérios usados para incorporação de medicamentos para doenças raras com outras agências no campo da Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS). Métodos: Trata-se de um estudo descritivo e exploratório em que foi realizado levantamento das demandas submetidas à CONITEC e suas recomendações ao SUS, de janeiro de 2012 a outubro de 2018, para tratamento de doenças raras. A seguir, foi feita uma comparação dos critérios utilizados por outras agências de ATS reconhecidas mundialmente para incorporação de medicamentos para doenças raras. A pesquisa bibliográfica foi realizada nas bases de dados PubMed, LILACS, sites da CONITEC, Ministério da Saúde e das agências de ATS, considerando um período de busca até dezembro de 2018. Resultados: Houve 55 solicitações de incorporação de medicamentos para o tratamento de 29 doenças raras à CONITEC. Sessenta e dois por cento destas solicitações foram por parte de indústrias. Essas solicitações foram realizadas com base em níveis variados de evidências clínicas, desde relatos de caso até revisões sistemáticas com metanálises. Análises de impacto orçamentário estavam presentes em 83% das solicitações, enquanto que análises econômicas em 64% delas. Trinta e três (59%) demandas foram incorporados no SUS. Como principais justificativas da CONITEC para a não incorporação, foram ausência de evidências clínicas de qualidade, não serem opções custo-efetivas e modestos benefícios clínicos que não justificam o alto preço. Entre as quatro agências de ATS internacionais, todas usam como critério considerações diferenciadas quanto às avaliações econômicas e apenas o NICE usa os seis critérios adotados nesse estudo para avaliação de tecnologias para doenças raras. Conclusão: Os avanços desde 2012 são indiscutíveis, já que 59% dos medicamentos avaliados foram incorporados ao SUS. Entretanto, ainda há desafios e oportunidades não só no Brasil, mas também em países cujas agências de ATS foram pioneiras, tamanha a relevância e atualidade do tema. Maior atenção orçamentária associada a critérios diferenciados para avaliação medicamentos órfãos para doenças raras, possivelmente traz robustez à tomada de decisão e maior potencial de acesso dos pacientes a tratamentos que podem salvar suas vidas.