Revista Portuguesa de Cardiologia (Mar 2012)
Modulação eletrofisiológica das aurículas e veias pulmonares: interação da estimulação simpática e parassimpática na inducibilidade de fibrilhação aguda auricular num modelo experimental in vivo
Abstract
Resumo: A influência do sistema nervoso autónomo (SNA) na génese da fibrilhação auricular (FA) envolve múltiplos mecanismos complexos com impacto nas propriedades eletrofisiológicas cardíacas. A importância dos efeitos da estimulação autonómica no substrato elétrico auricular e das veias pulmonares (VP) e na vulnerabilidade para FA requer melhor compreensão. Objetivo: Avaliar os efeitos da estimulação vagal (estim_vag) e simpática (estim_simp) aguda na condução e refratariedade das aurículas e VP e na indutibilidade de FA no coração de coelho in vivo com inervação autonómica preservada. Métodos: Estudámos 17 coelhos New Zealand de ambos os sexos. Para abordagem de «toráx-aberto» procedeu-se a anestesia, entubação e ventilação após bloqueio neuro-muscular. O ECG foi obtido a partir de 3 derivações dos membros. Os eletrogramas foram registados com 4 elétrodos monopolares colocados na superfície epicárdica, distribuídos ao longo das aurículas e com um elétrodo circular adaptado à porção proximal das VP. Estimulou-se o nervo vago cervical direito e o tronco simpático torácico com elétrodos bipolares de platina. Estudámos os períodos refratários efetivos (PRE) e a condução elétrica auricular, entre a aurícula direita lateral-alta (AD) e a aurícula esquerda lateral-alta (AE), e entre AD e VP, em condições basais e durante estim_vag, estim_simp e estimulação autonómica combinada (dual_estim). Para indução de FA, procedeu-se a pacing rápido (50 Hz, 10 s, isolado ou com estim_vag, estim_simp ou dual_estim) com elétrodo bipolar no apêndice auricular direito (AAD), apêndice auricular esquerdo (AAE) e VP. Resultados: Em condições basais: os PRE eram maiores no AAE e registou-se um atraso na ativação da AD para as VP, comparando com a condução interauricular. Durante estim_vag ou dual_estim: os PRE encurtaram significativamente em todos os locais, o intervalo de condução interauricular variou de 20 ± 4 ms para 30 ± 10 ms (p 10 s a arritmia terminou imediatamente após interrupção da estim_vagal. Conclusões: No coração de coelho inervado in vivo, a estimulação autonómica aguda encurta a refratariedade auricular e das VP, e modifica a velocidade de condução auricular, potenciando a indução e duração de FA. Os resultados sugerem que as variações agudas e a interação da atividade autonómica podem desempenhar um papel importante na fisiopatologia da FA. Abstract: Atrial fibrillation (AF) is a complex disease with multiple mechanisms, involving the interaction between the autonomic nervous system (ANS), electrophysiological properties of the atria and pulmonary veins (PVs), and vulnerability for AF. Aim: We assessed the effects of acute vagal (vagus_stim) and sympathetic stimulation (symp_stim) on atrial conduction, atrial and PV refractoriness and inducibility of AF in an in vivo rabbit model with preserved autonomic innervation. Methods: An open-epicardial approach was used in 17 anesthetized and artificially ventilated New Zealand white rabbits. The ECG was recorded with bipolar subcutaneous electrodes placed in the four limbs. Electrograms were obtained with four monopolar electrodes placed epicardially along the atria, and a circular electrode adapted to the proximal PVs. The cervical vagus nerve and thoracic sympathetic trunk were stimulated with bipolar electrodes. Epicardial activation was recorded in sinus rhythm, and effective refractory periods (ERPs) and conduction times from the high-lateral right atrium (RA) to the high-lateral left atrium (LA) and PVs were quantified at baseline and during vagus_stim, symp_stim, or combined vagal and sympathetic stimulation (dual_stim). Burst pacing (50 Hz, 10 s), alone or combined with vagus_stim, symp_stim or dual_stim, was performed in the right (RAA) and left atrial appendage (LAA) and PVs to test for AF inducibility. Results: At baseline, ERPs were higher in the LAA and there was a delay in the conduction time from RA to PV, compared to the mean activation time from RA to LA. During vagus_stim or dual_stim, ERP decreased significantly at all sites, and baseline interatrial activation times changed from 20 ± 4 ms to 30 ± 10 ms and 31 ± 11 ms, respectively (p<0.05). Symp_stim resulted in a significant decrease in ERPs only in the LAA, and a reduction of the interatrial interval to 16 ± 11 ms (p<0.05 vs baseline). AF inducibility ranged from 35% to 53% with baseline 50 Hz pacing, 65% to 76% during vagus_stim or symp_stim, and 75% to 100% with dual_stim (p<0.05). AF duration increased significantly during ANS stimulation. In two-thirds of the animals with longer inducible AF, the arrhythmia ceased immediately after cessation of vagus_stim. Conclusions: In the fully innervated rabbit heart in vivo, acute ANS stimulation shortens atrial and PV refractoriness, and significantly changes atrial conduction times, promoting AF induction and prolonging the arrhythmia. This underscores the importance of acute variations in ANS tone and its interactions in the pathophysiology of AF. Palavras-chave: Modelo animal, Vago, Simpático, Refratariedade, Velocidade de condução, Fibrilhação auricular, Keywords: Animal model, Vagus, Sympathetic, Refractoriness, Conduction velocity, Atrial fibrillation