A Cor das Letras (Feb 2017)

EL GOCE TOTALITARIO — SALÒ DE PASOLINI

  • Eduardo Subirats

DOI
https://doi.org/10.13102/cl.v11i1.1510
Journal volume & issue
Vol. 11, no. 1
pp. 193 – 204

Abstract

Read online

Há duas características fundamentais que definem o sentido espiri-tual e civilizatório da tortura. Uma delas é de ordem política. Em termos ex-tremamente rudimentares, isso pode ser formulado mediante a exemplaridade criminal com que certos setores que estão na vanguarda da organização política e militar do estado de direito anunciam seu próprio poder de sedição como a base para uma nova ordem de fato local ou global. É por causa dessa razão que a tortura — seja ela do tipo como a praticada du-rante a Inquisição colonial do séc. XVI, seja ela da sorte como a praticada nas penitenciárias coloniais da Guerra Global atual — precisa ocultar a sua brutalidade primitiva, sangrenta e sacrificial da sociedade, enquanto que, ao mesmo tempo, precisa assegurar a exibição de si mesma como uma demons-tração pública de poder que é tão absoluta quanto arbitrária. Saló fornece uma denúncia da tortura, mas simultaneamente interpreta a tortura como a escrita secreta de uma modernidade que legitima e dissemina tortura enquanto linguagem. E, por último, este filme também anuncia o advento de um novo fascismo global: o fascismo global que encara nossa face hoje.