Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
HIPOFIBRINÓLISE PERSISTENTE NA COVID-19 GRAVE ASSOCIADA AO AUMENTO DA ATIVIDADE DOS INIBIDORES DA FIBRINÓLISE
Abstract
Introdução: A coagulopatia associada à COVID-19 é caracterizada por hipercoagulabilidade e risco aumentado de trombose. Entretanto, o tempo para o início e persistência dessa coagulopatia não são bem caracterizados e podem ser avaliados via testes globais da coagulação. Objetivo: Avaliar as alterações globais da coagulação e a fibrinólise durante o primeiro mês após o início dos sintomas da COVID-19, e também determinar se estes parâmetros estão associados à gravidade em diferentes momentos da evolução clínica da doença. Método: Amostras de sangue foram coletadas em cinco ocasiões diferenciadas pelos dias de sintomas: 6ºao 10ºdia, 11ºao 15ºdia, 16ºao 20ºdia, 21ºao 25ºdia e 26ºao 30ºdia. Foram avaliadas as atividades do fibrinogênio (ensaio de Clauss), do plasminogênio, do PAI-1, da alfa 2-antiplasmina e os seguintes parâmetros do ROTEM: clotting time (CT, s), clot formation time (CFT, s), maximum clot firmness (MCF, mm), clot firmness at 20 min (A20, mm), α-angle (º) e maximum lysis (ML, %). Foram utilizados testes estatísticos de ANOVA com medidas repetidas, Mann-Whitney e Kruskal-Wallis. Resultados: Dentre os 85 pacientes incluídos, 70 (71%) tinham COVID-19 leve (pacientes ambulatoriais), sendo a maioria mulheres (n = 39, 65%) com uma mediana de idade de 35 anos (IQR 29-43). Vinte e cinco pacientes (29%) tinham doença grave e foram hospitalizados na UTI, sendo maioria homens (n = 22, 88%) com uma mediana de idade de 62 anos (IQR 50-72). Vinte indivíduos não infectados foram usados como controles. No início da infecção, não foi detectada nenhuma coagulopatia nos pacientes leves. Entretanto, a partir da segunda semana de doença, observamos uma tendência à hipercoagulabilidade, com aumento dos valores de MCF e A20 e diminuição de CT e CFT entre os dias 11 e 20 de sintomas. Não houve sinais de alteração da fibrinólise neste grupo. No grupo grave, observamos um quadro de hipercoagulabilidade desde a primeira semana de sintomas, com diminuição de CT e CFT e aumento de ângulo-α, MCF, A20 e fibrinogênio. Esse quadro foi persistente por 3 semanas, com tendência a reversão a partir do dia 26 do início dos sintomas nos pacientes que se mantiveram internados. Somado a hipercoagulabilidade, detectamos sinais de hipofibrinólise, com diminuição da porcentagem de lise (ML) no ROTEM. Associados a hipofibrinólise, observamos aumento dos níveis de PAI-1, alfa 2-antiplasmina e da relação entre alfa 2-antiplasmina e plasminogênio. Essas alterações se mantiveram durante todo o seguimento dos pacientes graves, por até 30 dias após o início dos sintomas. Discussão/Conclusão: A hipercoagulabilidade está presente nos primeiros dias de COVID-19 grave e após a segunda semana em COVID-19 leve, tendendo a normalizar ao final do primeiro mês de infecção nos pacientes que permaneciam hospitalizados. A tendência de reversão da hipercoagulabilidade observada nos casos graves pode ser justificada pela ocorrência de coagulação intravascular disseminada observada em estágios avançados de sepse. Além disso, há hipofibrinólise em pacientes com COVID-19 grave, associada ao aumento dos níveis de inibidores fisiológicos da fibrinólise. O estado de hipofibrinólise persiste por pelo menos 30 dias após o início da infecção e pode estar relacionado aos sintomas de COVID longa.