Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PACIENTE JOVEM: UM CASO DE NEOPLASIA MIELOIDE HEREDITÁRIA
Abstract
Introdução/Objetivos: Discutir caso de paciente jovem com Síndrome Mielodisplásica (SMD), inicialmente classificada como baixo risco, porém reclassificada como Leucemia Mieloide Aguda (LMA) com predisposição germinativa após a identificação de mutações de caráter somático e germinativo. Material e métodos: Revisão de prontuário médico e análise bibliográfica. Resultados: Mulher de 25 anos buscou avaliação por sintomas constitucionais e pancitopenia. Excluídas infecções virais, doenças autoimunes e neoplasias. Apresentava deficiência de vitamina B12 (143 pg/mL), corrigida, sem melhora do quadro. Avaliação medular com hipercelularidade, hiperplasia eritroide, displasia de séries eritrocítica e granulocítica, 1% de blastos, cariótipo normal; pequeno clone HPN associado. Estabelecido diagnóstico de Síndrome Mielodisplásica com baixa contagem de blastos, R-IPSS baixo risco. Evoluiu com piora progressiva das citopenias e alta demanda transfusional, iniciada busca de doador para TCTH alogênico, identificado irmão full-match. Após 7 meses de acompanhamento, foi realizada nova avaliação medular e pesquisa de mutações somáticas por NGS, identificadas hiperplasia acentuada e displasia eritroide (91,4% das células, sendo 22,8% proeritroblastos); 3,4% de blastos, cariótipo normal e presença de mutações RUNX1 (VAF 15,7%), ASXL1 (VAF 49,6%), PHF6 (VAF 13,4%), BCOR (VAF 13,9%) e TET2 (VAF 8,6%). Definido diagnóstico de LMA relacionada à Mielodisplasia. Considerando a idade da paciente e mutações identificadas, aventou-se a possibilidade de neoplasia mieloide associada à predisposição germinativa, confirmada pela identificação de mutação em homozigose no gene MBD4, em painel mutacional germinativo. Paciente evoluiu com rápida deterioração clínica e neutropenia muito severa, evoluindo a óbito por sepse de foco abdominal. Discussão: A SMD caracteriza-se por citopenias associadas à hematopoese clonal e evolução para leucemia aguda, cujo diagnóstico é corroborado por alterações citogenéticas e moleculares características. É uma condição rara em indivíduos abaixo de 50 anos, cenário em que deve ser considerada a possibilidade de síndromes hereditárias de predisposição a neoplasias mieloides. A variante patogênica em homozigose no gene MBD4 é rara e está relacionada a uma síndrome de predisposição hereditária a tumores, caracterizada por ocorrência de SMD, LMA, melanoma uveal e polipose colorretal em adultos jovens. A pesquisa da variante MBD4 em familiares pode auxiliar a definir o risco de recorrência familiar, e além disso, permitir o acompanhamento clínico dos indivíduos potencialmente afetados. Conclusão: A avaliação genética é uma importante ferramenta diagnóstica e prognóstica nos quadros de citopenias, permitindo a correta classificação e estratificação de risco do paciente e a otimização de recursos terapêuticos. A atenção à história familiar e a suspeição diagnóstica diante de apresentações atípicas são etapas fundamentais para a identificação de uma neoplasia mieloide associada à predisposição germinativa, o que impacta diretamente na seleção de doadores para transplante de medula óssea e no acompanhamento dos pacientes e dos familiares.