Jornal de Assistência Farmacêutica e Farmacoeconomia (Nov 2024)
ID029 Monitoramento do Horizonte Tecnológico: Ozanimode para o tratamento da esclerose múltipla
Abstract
Introdução A Esclerose Múltipla (EM) é uma doença desmielinizante, incurável, inflamatória e imunomediada do sistema nervoso central (SNC), que acomete principalmente jovens adultos na faixa etária dos 20 a 50 anos. Sua etiologia não é clara, contudo, envolve fatores genéticos e ambientais não estabelecidos que seriam os responsáveis pelas diferentes manifestações da doença, bem como, pelo comportamento responsivo aos tratamentos medicamentosos. A prevalência mundial, em 2016, era de 30,1 casos por 100.000 habitantes. No Brasil a prevalência média é de 8,69/100.000 habitantes podendo variar entre as regiões do país. A frequência com que as crises acontecem e permanecem, diferenciam a Esclerose Múltipla em remitente-recorrente (EM-RR), primariamente progressiva (EM-PP), Síndrome Clinicamente Isolada (Clinically Isolated Syndrome - CIS) e secundariamente progressiva (EM-SP). A esclerose múltipla remitente-recorrente (EM-RR) também chamada de surto-remissão é a forma mais comum da doença e caracteriza-se por crises que acontecem ao acaso gerando novos sintomas ou agravamento daqueles já existentes.O tratamento medicamentoso consiste principalmente na melhora clínica do paciente com a redução da ocorrência de surtos e abrandamento da gravidade dos sintomas. Corticosteroides em pulsoterapia são utilizados para acelerar a recuperação e retirar o paciente das crises. Ozanimode, disponibilizado comercialmente pelo nome Zeposia®, é um modulador de receptores de esfingosina 1-fosfato-S1P com alta afinidade de ligação aos subtipos S1P1 e S1P5 que atuam na regulação do tráfego de linfócitos, importantes células do sistema imunitário. É apresentado em cápsulas orais de 0,23 mg, 0,46 mg e 0,92 mg e , até o momento, não possui registro sanitário junto à autoridade brasileira competente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. A indicação original do medicamento é para o tratamento de adultos que apresentem tipos recorrentes da Esclerose Múltipla (EM). O mecanismo de ação de ozanimode na EM não é totalmente compreendido, todavia, pode evitar a neurodegeneração e processos inflamatórios do Sistema Nervoso Central. Assim, o objetivo do estudo foi identificar avaliações sobre o uso do ozanimode para o tratamento da esclerose múltipla. Métodos Para a realização do estudo foram realizadas as etapas para MHT segundo preconizado pelo Ministério da Saúde. Foram consultados os sítios eletrônicos de agências de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS), bem como de órgãos governamentais ou institutos internacionais que realizam ATS. Na pesquisa, realizada em 22 de dezembro de 2021 a estratégia de busca foi composta por duas etapas. A primeira objetivou identificar os registros de estudos clínicos de ozanimode para o tratamento de esclerose múltipla no ClinicalTrials.gov e no Cortellis. A busca no Cortellis foi realizada em 17 de novembro de 2021 com os termos ‘ozanimod’ e ‘multiple sclerosis’. Já a busca no ClinicalTrials foi realizada em 20 de dezembro de 2021 com os termos ‘ozanimod’, ‘Zeposia’ e ‘RPC1063’. Foram incluídos ensaios clínicos, randomizados ou não, a partir da fase 2, em que o ozanimode tenha sido utilizado para o tratamento da esclerose múltipla. Não houve restrição quanto ao idioma. Não foram incluídas análises post hocs, pool analysis ou extensão de ensaio clínico randomizado - ECR. Na segunda etapa, foi realizada busca nas bases Medline e PMC (via PubMed), Embase (via Portal Periódicos Capes) e Cochrane Library com o objetivo de localizar estudos publicados e não publicados referentes aos ensaios clínicos conduzidos que utilizaram o ozanimode no tratamento da esclerose múltipla. Resultados Consulta a agências regulatórias internacionais realizadas até 20/12/2021 revelaram que o medicamento ozanimode possui registro sanitário para o tratamento da esclerose múltipla recorrente-remitente em alguns países da América, Europa e Oceania. Foram encontradas três avaliações que incluíram o uso do ozanimode para o tratamento da esclerose múltipla, elaboradas pelas agências National Institute for Health and Care Excellence (NICE), Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health (CADTH) e Scottish Medicines Consortium (SMC). A busca por registro de estudos clínicos com ozanimode resultou na identificação de 5 protocolos, sendo 3 para esclerose múltipla (1 ensaio clínico randomizado (ECR) de fase 2, NCT01628393 e 2 ECRs de fase 3, NCT02047734 e NCT02294058). Os desfechos primários dos estudos, foram: número total de lesões realçadas por gadolínio em imagem de ressonância magnética cerebral, taxa anualizada de surto ajustada, eventos adversos e eventos adversos graves. Discussão e conclusões As evidências levantadas apontam que o ozanimode reduz o número de recidivas e lesões cerebrais quando comparado a betainterferona. Por outro lado, seu efeito na progressão da incapacidade não está bem estabelecido uma vez que não demonstrou melhoras para esse desfecho nos ensaios clínicos recuperados. Os efeitos colaterais mais comuns relacionados ao seu uso são nasofaringite e linfopenia. Agências de Avaliação de Tecnologias em Saúde como as do Reino Unido e Canadá encontraram incertezas na razão de custo-efetividade entre ozanimode e outras terapias modificadoras da doença ou estimativas de custo-efetividade acima do limiar estabelecido e não recomendaram o uso de ozanimode no sistema nacional de saúde. Já a agência escocesa recomendou uso restrito de ozanimode para um nicho específico de pacientes mediante acordo comercial sigiloso com o fabricante do produto. O ozanimode é de uso oral com exigência de apenas uma dose diária. O medicamento pode ser usado na primeira ou segunda linha de tratamento da esclerose múltipla recorrente-remitente e parece ter um melhor perfil de segurança para bradiarritmia em relação ao fingolimode. Entretanto, parece ter um custo elevado em relação a outros agentes modificadores da doença na esclerose múltipla. Ademais, por tratar-se de um medicamento novo, seus efeitos e sua segurança a longo prazo não estão completamente estabelecidos. Apesar do ozanimode ter demonstrado eficácia superior a fumarato de dimetila e glatirâmer, bem como ter apresentado resultados promissores na redução do número de recidivas e lesões cerebrais; esses resultados foram obtidos, por meio de análise indireta publicada (https://doi.org/10.2217/cer-2020-0267) e comparação direta com betainterferona. Esses pontos trazem algumas incertezas; por um lado o questionamento se a betainterferona seria o comparador ideal e, por outro a ausência de estudos head-to-head de alta qualidade para conhecer a relação de eficácia e segurança entre ozanimode e outras opções disponíveis no SUS.