Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
CARACTERIZAÇÃO CROMATOGRÁFICA E MOLECULAR DE HEMOGLOBINA RARA: RELATO DE CASO DA HEMOGLOBINA I-INTERLAKEN
Abstract
Objetivo: Relatar um estudo de caso de uma hemoglobina (Hb) rara denominada Hb I-Interlaken, a qual foi recebido e diagnosticado pelo Laboratório de Genética e Biologia Molecular da UFMS/CPTL. Materiais e métodos: Amostra de sangue de uma paciente do sexo feminino de 64 anos de idade, procedente de Campinas/SP, foi encaminhada para Laboratório de Genética e Biologia Molecular (UFMS/CPTL) para análise laboratorial de perfil hemoglobínico inconclusivo, juntamente com exames hematológicos complementares. Para determinar as frações hemoglobínicas da paciente, a amostra foi submetida à Cromatografia Líquida de Alta Performance (HPLC-Premier Resolution, Trinity Biotech). Para confirmação molecular do genótipo, os genes da α-globina (HBA2 e HBA1) foram amplificados por PCR-Touchdown e sequenciados pelo método de Sanger (sequenciador 3730xl DNA Analyzer, Thermo Fisher Scientific). Resultados: Após análises por HPLC, o perfil cromatográfico da paciente apresentou Hb A (67,9%), Hb A2 (2,0%) e Hb variante (22,2%) com o tempo de retenção relativo (RRT) a Hb A de 0,84 (RRT/A = 0,84). O sequenciamento completo do gene HBA2 não demonstrou presença de mutações para Hb variantes, enquanto o sequenciamento do gene HBA1 demonstrou a presença da mutação HBA1:c.47G>A em heterozigose, correspondente à Hb I-Interlaken (genótipo αα/ααI-Interlaken). Em relação aos dados hematológicos, os seguintes parâmetros foram observados: Eritrócitos de 4,27 milhões/mm3, Hb de 13,3 g/dL, Hct de 39,7%, VCM de 93 fl, HCM de 31,2 pg, CHCM de 33,5 g/dL e RDW de 13,3 %. Discussão: A Hb I-Interlaken (também conhecida como Hb J Oxford) corresponde a uma Hb α-variante rara, caracterizada por uma substituição de glicina na posição 15 da cadeia α por um ácido aspártico (GlyAsp), e ocorre principalmente entre os indivíduos descendentes de ingleses e italianos. Relatamos aqui o segundo caso dessa Hb no Brasil, sendo seu primeiro relato curiosamente também em paciente proveniente de Campinas/SP, demonstrando o efeito da imigração europeia e da miscigenação na composição gênica dessa população. Apesar da alteração estrutural na proteína final, a Hb Interlaken não apresenta alterações funcionais, sendo estável e possuindo afinidade normal pelo oxigênio; portanto, seus portadores não apresentam manifestações clínicas, com parâmetros hematológicos dentro dos valores de referência. No entanto, mesmo assintomática, a detecção dessa e de outras variantes raras de Hb é imprescindível para a determinação de sua incidência e para o entendimento do fluxo dessas mutações na população brasileira. Além disso, a combinação de Hb α-variantes com outras mutações estruturais ou talassemias pode resultar em fenótipos clinicamente relevantes, realçando a importância da identificação dessas Hb. Nesse sentido, a associação de diferentes metodologias laboratoriais, como análises cromatográficas e moleculares, permite a detecção correta de Hb raras. Conclusão: A Hb I-Interlaken é uma Hb α-variante rara e tem pouco significado clínico. A presença de Hb anormais podem refletir o grau de miscigenação no Brasil e evidenciam a importância do estabelecimento de padrões e estratégias cromatográficas e moleculares para análises das amostras de Hb da população, além de desenvolver estudos com métodos combinados visando um diagnóstico preciso.