Remate de Males (Nov 2011)
O humor em ruínas em Fim de Partida
Abstract
O presente ensaio busca produzir uma reflexão sobre o humor em torno da peça Fim de Partida, de Samuel Beckett. A hipótese a ser explorada é a de que nela são colocados em questão diversos de seus procedimentos de forma altamente destrutiva, e a significação retroativa que seus destroços passam a ter adquirido nesse processo podem ser extrapolados de modo a produzir um pequeno vislumbre, de dentro da própria peça, sobre seu estatuto de obra de arte. Para tanto, faz-se uso principalmente da teoria freudiana do Witz, investigando a forma como Fim de Partida se relaciona a cada uma das categorias postuladas por Freud: o esvaziamento quase absoluto dos personagens impossibilita a descarga de riso proporcionada pelo Witz propriamente dito, revertendo-se em uma espécie de espasmo; a relação de superioridade estabelecida no cômico se encontra paradoxalmente subvertida na relação da peça com a tradição, que, por meio da paródia, surge em cena com a máxima força; por fim, o distanciamento que caracteriza a concepção freudiana do humor se encontra totalmente desvirtuado, simultaneamente servindo como forma de neutralização das reações dos personagens – e mesmo da platéia – e como proteção última da peça contra a própria realidade, materializando-se como a quarta parede que separa a ação dos espectadores. O resultado desse processo tem como horizonte a redução de todos os elementos de Fim de Partida, como afirma Adorno (1985), a “lixo cultural”, sendo o humor incapaz de fazer frente à desolação de um mundo em ruínas.
Keywords