Horizontes Antropológicos (Jun 2011)
A desnaturalização da menstruação: hormônios contraceptivos e tecnociência
Abstract
Com o desenvolvimento da contracepção hormonal a partir de 1950, tornou-se possível não apenas intervir sobre o potencial reprodutivo dos ciclos férteis femininos, como também produzir uma alteração nos padrões de sangramentos menstruais. Inicialmente considerada um efeito colateral "indesejável", a supressão da menstruação passou, a partir da década de 1990, a ser reapresentada: novas configurações de contraceptivos hormonais propuseram a suspensão dos sangramentos por longos períodos. Neste artigo, discuto os argumentos apresentados por um dos maiores entusiastas desses métodos: o médico baiano Elsimar Coutinho, autor do livro Menstruação, a sangria inútil. Suas justificativas passam por referências à fertilidade e sexualidade de primatas não humanos, assim como pela desassociação entre menstruação e natureza, e por uma analogia com o desacreditado método das sangrias terapêuticas. Proponho problematizar o recurso de Coutinho às distinções entre natureza e cultura, procurando revelar algumas das articulações entre corpo, gênero e hormônios que esse debate permite acessar.With the development of hormonal contraception in the 1950s, it became possible not only to intervene over the reproductive potential of feminine fertile cycles, but also to produce an alteration in bleeding patterns. Initially considered an "undesired" collateral effect, menstruation suppression began to be re-presented in the 1990s: new configurations of hormonal contraceptives proposed the suspension of bleedings for long periods of time. In this article, I discuss the arguments presented by one of the greatest enthusiastic of these methods: Elsimar Coutinho, a medical doctor from Salvador, Bahia, the author of Menstruation, a useless bleeding. His arguments focus on references to nonhuman primates' fertility and sexuality, on the disarticulation between menstruation and nature, and on an analogy with the disbelieved method of therapeutic bleedings. I propose to question Coutinho's use of the distinctions between nature and culture, intending to reveal some of the articulations of body, gender and hormones that this debate allows us to access.
Keywords