Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
ANÁLISE MOLECULAR DE 32 CASOS DE DOENÇA DA HB H IDENTIFICADOS NO LABORATÓRIO DE HEMOGLOBINOPATIAS DO HC/UNICAMP (2002-2023)
Abstract
As talassemias alfa (α) são frequentemente causadas por deleções nos genes da globina α (HBA1 e HBA2), e podem envolver um ou ambos os genes, o que resulta em redução parcial (alelo α+ ou -α) ou supressão total (alelo α0 ou –) da produção das globinas α. Raramente, as talassemias α podem resultar de mutações de ponto ou pequenas deleções/inserções. A heterozigose, a homozigose ou a interação destes diferentes alelos resultam em um amplo espectro de manifestações clínicas e laboratoriais. A Doença da Hemoglobina (Hb) H ocorre quando há uma deficiência acentuada na produção de globinas α, visto que apenas um gene α encontra-se funcional (interação α+/α0). Desta forma, nos fetos e recém-nascidos o excesso de cadeias γ forma a Hb Barts (γ4), e nos adultos o excesso de cadeias β forma a HbH (β4), um tetrâmero instável que precipita nas hemácias com o seu envelhecimento, ocasionando anemia hemolítica moderada a grave, com icterícia e hepatoesplenomegalia. Desde sua implantação em 1980, o Laboratório de Hemoglobinopatias do HC/UNICAMP, referência no diagnóstico molecular da talassemia α, analisou cerca de 150.000 amostras de sangue, a maior parte de indivíduos provenientes da região sudeste do Brasil, mas também da região nordeste, centro-oeste e sul, bem como de parte da América Latina. Apresentamos aqui um recorte dos casos de Doença da HbH caracterizados desde 2002 até o presente momento. Na triagem protéica foram realizadas eletroforese (pHs alcalino e neutro), cromatografia líquida de alta performance (HPLC) e identificação da HbH em hemácias do sangue periférico (esfregaço sanguíneo corado com azul de cresil brilhante). Na caracterização molecular, as deleções mais comuns [-α3.7, -α4.2, -(α)20.5, –MED, –SEA, –FIL, –THAI] foram rastreadas por multiplex -gap -PCR e outras deleções foram investigadas por multiplex ligation -dependent probe amplification (MLPA). As mutações não delecionais mais comuns (α1-Nco I, α2-Nco I, α2-Hph I e α2TSAUDI) foram investigadas por análise de restrição, PCR alelo-específico e/ou sequenciamento direto. Trinta e dois (32) casos de Doença da HbH foram identificados em 27 famílias diferentes. Os alelos α+ resultaram de deleções em 30 casos: deleção -α3.7, a mais frequente na população mundial, encontrada em 29 casos e -α4.2 em um caso; outras duas mutações originaram alelos α+: em um caso encontramos uma mutação no sítio doador de splicing do primeiro íntron do gene HBA2 {α2-IVSI-1 [α2 nt 133 G>A (HBA2:c.95+1G>A)]} e um caso envolvia Hb variante instável {Hb Icaria [α2 142 Stop>Lys (HBA2:c.427T>A)]}. Os alelos α0 resultaram de diferentes deleções, tais como: deleções iniciando desde o telômero com variações estendendo-se até o gene SOX8 (225 a 1050 kb) foram identificadas em 8 casos, deleção –SEA em 7 casos, deleções iniciando na região do elemento regulatório do cluster α (HS40) com variações estendendo-se até o gene AXIN1 (15 a 175 kb) em 6 casos, deleção –MED em 6 casos, deleção -(α)20.5 em 2 casos e 3 casos apresentaram deleção apenas da região do HS40. Esses resultados evidenciam a expressiva variabilidade de mutações talassêmicas no cluster α presentes na nossa população, bem como reforça a importância do diagnóstico preciso, evitando, assim, procedimentos e esquemas terapêuticos equivocados, especialmente, quando os indivíduos apresentam microcitose e hipocromia.