Viso (Jun 2025)

Entre cartas de arquivo e imagens construídas. O cinema na beira da história: uma análise do filme Na ventania

  • Ivana Grehs

DOI
https://doi.org/10.22409/1981-4062/v36i/606
Journal volume & issue
Vol. 19, no. 36
pp. 171 – 199

Abstract

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Em um único dia, 14 de junho de 1941, cerca de dez mil estonianos foram deportados em trens de carga para campos de trabalhos forçados na Sibéria. Mais da metade morreu de fome, doença ou execução. Em 2014 um jovem cineasta decide contar em uma obra cinematográfica as histórias que ouvia de seu avô, um sobrevivente do período da ocupação soviética. O tema da barbárie produzida pelo Estado soviético contra seus opositores na Estônia, mantida oculta por 50 anos, só pôde ser descortinada a partir do declínio da União Soviética em 1991. Propomos neste artigo analisar as escolhas estéticas estabelecidas por esse jovem cineasta e sua equipe, a partir do conceito de fronteira sob quatro pontos de vista: primeiro o contexto histórico que delineia o conflito bélico entre as nações; depois, os limites muitas vezes borrados entre o que é inventado e o que é real em um filme de ficção histórica, além da desconcertante incerteza no confronto entre a rememoração das testemunhas e os documentos históricos - as cartas escritas em cativeiro e que serviram como estopim da obra; terceiro, o limiar entrecruzado pela imagem estática, a imagem em movimento no plano sequência, e uma narrativa em voz-over; e por fim, evocamos em nossa análise a alegoria do ‘anjo da história’ de Walter Benjamin – o anjo olha para o passado em direção às ruínas, aos restos da história, das cartas guardadas, das lembranças congeladas. O anjo arregala seus olhos de horror e escancara sua boca num grito mudo, ainda que tente resistir à ventania e salvar os mortos do esquecimento do tempo.

Keywords