Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
ALERTA PARA A IMPORTÂNCIA DA ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL NA DOENÇA HEMOLÍTICA PERINATAL: UM RELATO DE CASO
Abstract
Objetivo: Relatar um caso de Doença Hemolítica Perinatal (DHPN) por aloanticorpo anti-c e a importância da abordagem multiprofissional para acompanhamento precoce da doença e prevenção da morbimortalidade fetal e neonatal. Relato de caso: S.M.C.A., 37 anos, G4C1A2, Idade Gestacional (IG) 16 semanas, classificação sanguínea A Rh(D) positivo. Última gestação há 2 anos com interrupção por parto cesáreo em IG 32+1 por hidropsia e constrição ductal visualizada em ultrassom doppler, sendo o recém-nascido (RN) pouco vigoroso, em anasarca, grave estado geral, necessitando de reanimação neonatal e exsanguineotransfusão. Devido ao quadro anterior, a paciente foi encaminhada ao Serviço de Hemoterapia do Hospital São Vicente de Paulo (SHHSVP) para realização do estudo imunohematológico, os mesmos foram realizados na metodologia gel teste (Bio-Rad), que apresentou fenotipagem eritrocitária C+, E-, c-, e+, K-, Pesquisa de Anticorpo Irregular (P.A.I.) positivo, Identificação de Anticorpo Irregular (I.A.I) anti-c, Coombs Direto (TAD) poliespecífico negativo e titulação anti-c inicial de 1024. Foram realizados estudos mensais, totalizando 6 estudos imuno-hematológicos para acompanhamento da titulação anti-c, que chegou a 2048, sendo então orientado à equipe assistente pela hematologista do serviço de hemoterapia, sobre o aumento da titulação e necessidade de acompanhamento ultrassonográfico para sinais de hidropsia fetal. Devido a gestação de risco foi indicada a interrupção da gestação em IG 34+6, com RN em regular estado geral, pálido, ictérico zona 3, presença de hepatomegalia e esplenomegalia, disfunção ventilatória e sepse neonatal. No primeiro dia foi realizado transfusão simples e um procedimento de exsanguíneo transfusão e no segundo dia necessitou de mais um procedimento de exsanguíneo transfusão. A incompatibilidade materno-fetal por aloanticorpo anti-c foi confirmada através de fenotipagem eritrocitária do RN, que apresentou antígeno c positivo. Também foi sugerida a realização de estudo imuno-hematológico do parceiro da paciente relatada, para orientações futuras. Após 15 dias de internação, RN recebeu alta hospitalar e seguiu com acompanhamento ambulatorial. Discussão: A DHPN afeta 1/300 a 1/600 nascidos vivos, sendo que até 1 em 80 mulheres grávidas têm aloanticorpos de hemácias clinicamente relevantes. Mais de 50 antígenos diferentes podem ser responsáveis pela DHPN, sendo os mais potentes D, K e c (Venkatachala, et al. 2021). Devido a falta de profilaxia disponível para o antígeno c, quando este está envolvido, ocorre DHPN grave. O sistema imunológico tem uma memória para que mulheres aloimunizadas desenvolvam uma resposta imune mais eficiente para repetir a exposição ao mesmo antígeno de hemácias em uma gravidez futura, com DHPN esperado para ocorrer mais cedo e com maior gravidade (Castleman, et al. 2020). Conclusão: É essencial que seja de conhecimento multiprofissional que a DHPN não ocorre apenas por aloanticorpos anti-D, sendo necessária a comunicação direta entre as equipes de obstetras, neonatologistas, anestesistas e hematologistas para um manejo adequado da gestante e do RN, visto que a DHPN está associada a um risco aumentado de morbimortalidade perinatal, tanto pela prematuridade quanto pelos efeitos diretos da anemia e hiperbilirrubinemia. O serviço de hemoterapia precisa estar preparado com bolsas previamente selecionadas para os casos em que se faz necessário o procedimento de exsanguíneo transfusão decorrentes de aloimunização que não seja pelo clássico anti-D. Reforçar assim a indicação de pelo menos um estudo imuno-hematológico em todas as gestantes, independentemente do grupo sanguíneo RhD e nos casos de histórico de aborto prévio.