Princípios (May 2017)
O robe de Descartes: uma discussão em torno da melancolia e da origem da razão moderna [Descartes' robe: a discussion on melancholy and the origin of modern reason]
Abstract
A melancolia é descrita no século XVII na Enciclopédia de Diderot e d’Alembert como um “delírio da alma” que pode ser notado por outra pessoa através do comportamento, da linguagem, do estado de humor, etc. Mas como eu mesmo poderia saber se estou delirando ou não? Esse verbete parece ter um endereço: a própria raiz da Razão moderna. Não é esse o tema central em Descartes: a fundamentação da Razão e a possibilidade da loucura? No Discurso do método e nas Meditações metafísicas, Descartes parte de situações “fictícias”: sua própria vida, sua experiência diante de uma lareira com seu robe, etc. – fictícias porque não se sabe exatamente se se trata de um delírio ou não. Sua obra é descrita como uma fábula, como ele mesmo o diz. O tempo todo ele está diante de “fantasmas”: a possibilidade da loucura, de um Gênio Maligno... Não é exatamente essa descrição da melancolia que Descartes temia – de uma possibilidade de se viver numa “doença da alma”? Este texto busca mostrar que a Razão moderna, ao invés de tentar excluir o delírio de seu interior, é credora, no fundo, de uma reflexão que leva a sério a possibilidade da loucura. [Melancholy is described in the eighteenth century in Diderot and d'Alembert’s Encyclopedia as a “delirium of the soul” that can be noticed by others through one’s behavior, language, mood, etc. But how could one know whether or not one is delirious? This entry seems to be addressing: the very root of modern reason. Is this not the central theme in Descartes: the foundation of Reason and the possibility of madness? In Discourse on the Method and Meditations on First Philosophy, Descartes starts from of a “fictitious” situations: his life, his experience in front of a fireplace with his robe, etc. Fictitious because it is not known exactly whether this is just a delusion or not. His work is described as a fable, as he himself says. All the time he is facing “ghosts”: the possibility of madness, an Evil Genie... It this not exactly the description of melancholy that Descartes feared – the possibility of one’s living with a “disease of the soul”? The present text goals to show that modern reason, rather than trying to exclude delirium from its interior, it owes a great deal to a reflection that takes the possibility of madness seriously.]
Keywords