Revista Portuguesa de Cardiologia (Jul 2012)
O treino de ortostatismo (tilt training) aumenta a reserva vasoconstritora em doentes com síncope reflexa neurocardiogénica
Abstract
Resumo: A síncope neurocardiogénica (SNc) é uma entidade clínica comum, resultante de uma resposta autonómica reflexa excessiva durante o stress ortostático. As diferentes opções terapêuticas são controversas e de eficácia limitada. O treino de ortostatismo (TTr) tem-se mostrado uma alternativa prometedora no tratamento destes doentes (D). No entanto, permanece por esclarecer o seu mecanismo de ação e o impacto clínico numa população com SNc recorrente. Objectivo: Caracterizar a resposta hemodinâmica e autonómica durante um programa de TTr em doentes com SNc refratária às medidas convencionais. População e métodos: Foram estudados 28D (50% do sexo masculino, 41 ± 14 anos), sem evidência de cardiopatia, com SNc documentada em teste de ortostatismo passivo. O TTr incluiu 9 sessões hospitalares (3x/semana, 30 minutos) com monitorização contínua de pressão arterial e frequência cardíaca (60° - 6 sessões - 70° - 3 sessões), complementadas com treino diário no domicílio e elevação da cabeceira a 10° durante o sono. O volume sistólico, o débito cardíaco, a resistência vascular periférica, a sensibilidade do barorreflexo e a variabilidade da frequência cardíaca foram calculados. Todos os doentes foram reavaliados no fim do 1.° mês e no final de cada 6 meses num período máximo de 36 meses (follow-up 24 ± 12 meses). Resultados: Ao longo das sessões de TTr verificou-se um aumento significativo e consistente da resistência total periférica (1485 ± 225 vs. 1591 ± 187 dyne*s/cm−5, p < 0,05) associado a uma diminuição do seu desvio-padrão (206 ± 60 vs. 150 ± 42, p < 0,05). Durante o período de follow-up, houve recorrência de síncope em 5D (19%), com redução significativa do numero de síncopes (4,0 ± 3,2/D nos 12 meses pre-TTr vs. 1,4 ± 0,8/D pos-TTr, p < 0,05). Conclusão: Em doentes com SNc refratária, o TTr mostrou ser uma opção terapêutica eficaz, com beneficio a longo prazo. A melhor tolerância ao ortostatismo parece resultar do aumento da reserva vasoconstritora e da sua menor variabilidade. Abstract: Neurocardiogenic syncope (NCS) is a common clinical entity resulting from an excessive reflex autonomic response, particularly during orthostatism. Treatment options are controversial and of limited effectiveness. Tilt training (TT) is a promising option to treat these patients. However, its mechanism of action and clinical impact remain unclear. Objective: To characterize hemodynamic and autonomic responses during a TT program in patients with NCS refractory to conventional measures. Methods: We studied 28 patients (50% male, mean age 41 ± 14 years) without structural heart disease, with NCS documented by tilt testing. The TT program included 9 tilt sessions (3 times a week, 30 min) (60° – 6 sessions, 70° – 3 sessions), under ECG and blood pressure monitoring combined with home orthostatic self-training and 10° head-up during sleep. Systolic volume, cardiac output, total peripheral resistance, baroreflex sensitivity and heart-rate variability were computed. Patients were reassessed at 1 month and every 6 months for a maximum of 36 months (24 ± 12 months). Results: Over the course of the TT program there was a significant increase in total peripheral resistance (1485 ± 225 vs. 1591 ± 187 dyn·s·cm−5, p < 0.05), with a decrease in standard deviation (206 ± 60 vs. 150 ± 42, p < 0.05). During follow-up, syncope recurred in five patients (19%), with a significant reduction in the number of episodes (4.0 ± 3.2/patient in the 12 months before TT vs. 1.4 ± 0.8/patient post-TT, p < 0.05). Conclusion: In refractory NCS, TT may be an effective therapeutic option, with long-term benefits. These results appear to be due to an increase in vasoconstrictor reserve combined with a reduction in its variance. Palavras-chave: Síncope, Treino de ortostatismo, Sistema nervoso autónomo, Keywords: Syncope, Tilt training, Autonomic nervous system