Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)

ESTUDO FAMILIAL REVELA O PRIMEIRO CASO DE HEMOGLOBINA OTTAWA EM COERANÇA DE ALFA TALASSEMIA NO BRASIL

  • BBV Marques,
  • KC Piva,
  • LNS Nunes,
  • ACM Berti,
  • LA Souza-Júnior,
  • IS Dias,
  • A Purificação,
  • TRB Azevedo,
  • T Amorim,
  • E Belini-Júnior

Journal volume & issue
Vol. 46
pp. S652 – S653

Abstract

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Objetivo: Relatar o primeiro caso no Brasil de interação da hemoglobina (Hb) variante Ottawa com alfa talassemia em um estudo familial. Materiais e métodos: Amostra de sangue total de uma criança do sexo feminino de dez meses, proveniente da APAE – Salvador/BA, foi recebida pelo Laboratório de Genética e Biologia Molecular (LGBM) da UFMS/CPTL, juntamente com as amostras de ambos os progenitores para confirmação diagnóstica de hemoglobinopatias. No hemograma do probando constava Hb (9,8 g/dL), VCM (78,6%), HCM (26,8%), CHCM (34,0%) e RDW (14,4%). Com base nesses dados, a amostra da criança, bem como a dos pais, foi submetida a Cromatografia Líquida de Alta Performance (HPLC), Trinity Biotech, e análises moleculares (PCR-RE, PCR-Multiplex e Sequenciamento de DNA por Sanger). Resultados: O perfil cromatográfico do probando indicou uma concentração incomum de Hb A (66,4%) e elevada concentração de Hb A2 (3,1%), acompanhadas de uma Hb variante no tempo de retenção relativo a Hb S de 1.06 (RRT/S 1.06) em uma concentração sugestiva de Hb alfa(α)-variante (18,9%), com possível presença de α-talassemia. A cromatografia do pai revelou a presença de Hb A (69,6%), Hb A2 (2,7%) e uma Hb variante (20,8%) de comportamento similar à encontrada no probando, enquanto a mãe apresentou um perfil cromatográfico sem sinais aparentes de hemoglobinopatias, com concentrações normais de Hb A (95,3%) e Hb A2 (2,7%). Os perfis cromatográficos guiaram as análises moleculares, onde identificou-se a mutação delecional de α-talassemia (-α3,7kb) em heterozigose tanto no probando quanto na mãe, e ausência de Hb S no probando e no pai. Devido às suspeitas de Hb α-variante, as amostras foram encaminhadas para sequenciamento dos genes HBA2 e HBA1 , no qual foi identificada a presença da mutação HBA1:c.46G>C (Hb Ottawa) em heterozigose tanto no probando, quanto no genitor. Discussão: Os resultados obtidos permitiram a conclusão do diagnóstico do probando como heterozigoto para Hb Ottawa e coerança de alfa talassemia (-α3,7kb) em heterozigose (-α3,7/ααOttawa). A Hb Ottawa (ou Siam) é uma variante rara de cadeia alfa, onde a mutação resulta na substituição de uma glicina por uma arginina no códon 15 do gene HBA2 ou HBA1 . Até o momento, essa variante não havia sido documentada no Brasil em coerança com alfa talassemia, tornando este o primeiro registro dessa associação. Em heterozigose, a Hb Ottawa é assintomática, sugerindo que a anemia microcítica e hipocrômica observada no hemograma do probando é decorrente da presença da α+talassemia, a qual acarreta na redução das sínteses de cadeias alfa, e portanto, no prejuízo, principalmente, da formação do tetrâmero Hb A. Apesar da sua baixa ocorrência e ausência de manifestações clínicas em heterozigose, a associação da Hb Ottawa com o traço falciforme (HbAS), pode desencadear crises vaso-oclusivas graves, e a não detecção dessa variante por análises moleculares pode levar ao falso diagnóstico de doença falciforme, considerando que seu perfil cromatográfico e padrão de migração eletroforética são similares a Hb S. Conclusão: Casos de Hb variantes raras acompanhadas de talassemias demonstram a relevância da associação das metodologias laboratoriais, bem como de laboratórios de apoio com profissionais especializados na identificação molecular de variantes globínicas para a determinação genotípica os pacientes, permitindo uma posterior orientação genética e acompanhamento clínico adequados aos familiares.