Campos (Oct 2007)
“Remédio da Ciência” e “Remédio da Alma”: os usos da secreção do kambô (Phyllomedusa bicolor) nas cidades
Abstract
Desde a metade da última década, em grandes cidades do Brasil, começou a se difundir o uso da secreção da rã arbórea Phyllomedusa bicolor, chamada de kambô. Tradicionalmente usada como revigorante e estimulante para caça por grupos indígenas do sudoeste amazônico (entre eles, Katukina, Yawanawa e Kaxinawá)2, nos centros urbanos tem havido um duplo interesse pelo kambô: como um “remédio da ciência” – no qual se exaltam suas propriedades bioquímicas – e como um “remédio da alma” – onde o que mais se valoriza é sua “origem indígena”. O kambô tem se difundido, sobretudo, em clínicas de terapias alternativas e no ambiente das religiões ayahuasqueiras brasileiras, isto é, entre adeptos do Santo Daime e da União do Vegetal e de suas dissidências. Os aplicadores são bastante diversos entre si: índios, seringueiros e ex-seringueiros, terapeutas holísticos, líderes ayahuasqueiros e médicos. Neste artigo apresentaremos uma breve etnografia da difusão do kambô, analisando, sobretudo, o discurso que esses diversos aplicadores têm elaborado sobre o uso da secreção3, compreendida por alguns como uma espécie de planta de poder, análoga ao peiote e à ayahuasca.