Espaço Ameríndio (Dec 2007)
CORPO, CONHECIMENTO E PERSPECTIVA: A FENOMENOLOGIA DE MAURICE MERLEAU-PONTY E O PERSPECTIVISMO AMERÍNDIO
Abstract
ABSTRACT: This article aims to establish a parallel of comparison between Merleau-Ponty's phenomenology and amerindian perspectivism, mainly on body and knowledge relations. Merleau-Ponty's influence on anthropology resulted in studies concerning body's centrality insocialization processes, which are fundamental in our knowledge experience of the world. The world we know is the world experienced through body's perception. In our intersubjective relations, the possibility of knwowledge expansion - reason enlargement - emerges through the intense relation of the other's perspective with mine. Thus, the possibility of intersubjective comprehension envolve the reference to a world mutually shared. In indigenous societies, wemay say that, between humans, intersubjective relations point to socialization processes which refer to bodies that share the same world. On the other hand, amerindian perspectivism theory afirms that, in the relation with extra-human orders of the cosmos - animals, spirits, divinities - bodies point to distinct worlds. A amplified notion of "human condition" is what makes possiblecomprehend these multiple worlds. This comprehension only occurs through a body's capacity to adopt modes of being and acting of these Others and, thus, ascending to anOther point of view. Here, distinct from Merleau-Ponty's phenomenology, there is no fusion of perspectives, since they need to be mantained in their difference. That is, knowledge of extra-human orders aims tu subjectivate differente perspectives, but always having as an horizon the assurance of human perspective.RESUMO: Este artigo procura traçar um paralelo entre a fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty e o perspectivismo ameríndio, principalmente no que tange à relação entre corpo e conhecimento. A influência de Merleau-Ponty na Antropologia resultou em estudos que enfocam a centralidade do corpo em processos cotidianos de socialização, os quais são fundamentais na experiência de conhecimento do mundo. O mundo que conhecemos é o mundo experienciado pela percepção, a qual está no corpo. Nas relações intersubjetivas, a possibilidade de ampliação do conhecimento - alargamento da razão - está fundamentada na idéia de um mundo que emerge da imbricação entre a minha perspectiva e a do outro. A possibilidade de compreensão envolve a referência a um mundo compartilhado mutuamente. Nas sociedades indígenas, podemos dizer que, na esfera intra-humana, as relaçõesintersubjetivas apontam para processos de socialização fundamentados em corpos que estão referenciados a um mundo compartilhado. Por outro lado, a teoria do perspectivismo ameríndio ressalta que, na relação com ordens extra-humanas do cosmos - animais, espíritos,divindades - os corpos apontam para mundos distintos. A noção ampliada de "condição humana", que assemelha "a gente" aos animais, espíritos e divindades, possibilita a compreensão desses múltiplos mundos. Esta compreensão somente ocorre através da capacidade de um corpo adotar os modos de ser e agir desses Outros e, dessa maneira,ascender a um Outro ponto de vista. Aqui, diferentemente da fenomenologia de Merleau-Ponty, não há uma imbricação das perspectivas, na medida em que estas precisam ser mantidas emsua diferença. Isto é, o conhecimento de ordens extra-humanas visa subjetivar outras perspectivas tendo sempre como horizonte a manutenção da perspectiva humana.