Cadernos de Saúde Pública (Apr 1997)

Riscos e benefícios da triagem genética: o traço falciforme como modelo de estudo em uma população brasileira Risks and benefits of genetic screening: the sickle cell trait as a model in a Brazilian population group

  • Roberto Benedito de Paiva e Silva,
  • Antonio Sérgio Ramalho

DOI
https://doi.org/10.1590/s0102-311x1997000200018
Journal volume & issue
Vol. 13, no. 2
pp. 285 – 294

Abstract

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A triagem populacional de heterozigotos assintomáticos para fins de orientação genética é um procedimento bastante controvertido, por envolver o risco de rotulação, discriminação, estigmatização, perda de auto-estima e invasão de privacidade. Assim sendo, investigou-se no presente trabalho os efeitos da orientação genética fornecida a indivíduos diagnosticados como heterozigotos do gene da hemoglobina S (heterozigotos AS, portadores do traço falciforme) durante a triagem de doadores de sangue. Foram convidados por carta 92 doadores AS para receber orientação genética gratuita e individualizada, 66 dos quais (72%) aceitaram o convite. Cerca de 50% dos indivíduos trouxeram a parceira e/ou os filhos para investigação laboratorial das hemoglobinopatias, identificando-se assim alguns casais de risco e algumas crianças com anemia hemolítica crônica. Seis meses após o fornecimento da orientação genética, foi possível avaliar por entrevista pessoal ou por carta-questionário 43 doadores AS (65%), constatando-se uma boa assimilação das informações fornecidas. A orientação genética não produziu mudanças significativas na vida da maioria dos indivíduos e os riscos teóricos da orientação genética não aparecem de forma preocupante na casuística examinada. Foram constatados de forma esporádica, no entanto, indícios de estigmatização, rotulação, discriminação, perda da auto-estima e invasão de privacidade.Population screening of asymptomatic heterozygotes for genetic guidance purposes is a very controversial procedure due to the risk of labeling, discrimination, stigmatization, loss of self-esteem, and invasion of privacy. Effects of genetic counseling supplied to blood donors with the sickle cell trait (AS heterozygotes) were investigated. Ninety-two AS donors were invited by letter to a free, individual orientation session; 66 of them (72%) accepted the invitation. Some 50% of the individuals brought their wives and children for examination, thus allowing identification of several at-risk couples (13%) and children with sickle cell anemia (5%). Six months afterwards 43 AS donors (65%) were reevaluated, whereby it was observed that the information had been well assimilated. The theoretical risks of genetic screening did not appear to be cause for concern in most of the cases examined. However, signs of stigma, labeling, discrimination, loss of self-esteem, and invasion of privacy were evidenced in a few cases.

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