Revista Maracanan (Apr 2022)
"A Hora Vermelha”: violência poética e o tempo da transformação em Et les chiens se taisaient, de Aimé Césaire
Abstract
Na primeira tragédia de Aimé Césaire, Et les chiens se taisaient (publicada pela primeira vez em 1946), um herói anticolonial, o Rebelde, luta em um mundo ficcional, anterior à abolição, onde o passado detém uma apreensão profética do futuro. Césaire articula a transformação social por meio de estruturas temporais intempestivas associadas a ciclos orgânicos de vida, mudanças sazonais e imprevisibilidade meteorológica. Esses modelos ecológicos proveem os registros figurais através dos quais Césaire descreve a revolução como uma erupção violenta do novo em todos os níveis da existência. Esses poéticos atos de criação violenta, impossíveis de serem previstos ou contidos, envolvem a intensidade específica e a temporalidade peculiar do nascimento. Este ensaio sugere que a revolta escrava em Les chiens apresenta a intempestividade da descolonização como uma poética que rejeita fundamentalmente noções mecânicas da mudança determinadas por modelos lineares do tempo e da história. Lendo Les chiens através de alusões ao material de suas fontes filosóficas, mostro como muito do que Césaire constela pode ser vinculado, tanto genealogicamente quanto esteticamente, a dois esquemas temporais distintos, associados à Antiguidade grega: a renovação cíclica dionisíaca e o “tempo certo” kairológico. Embora opostos com frequência em um nível filosófico, esses dois esquemas intempestivos, como justapostos por Césaire, expressam a temporalidade plural e poética das erupções trágicas da revolução decolonial. Seu encontro com o dionisíaco de Nietzsche e com o kairós de teólogos políticos envolveu conceitos que, em sua qualidade de expressões de primitividade, revelam ao mesmo tempo a herança civilizacional da África e as forças destrutivas capazes de levar o imperialismo europeu à queda.
Keywords