Revista Brasileira de Alfabetização (Dec 2015)
ESSA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: MAIS UMA TRAGÉDIA BRASILEIRA?
Abstract
As reflexões apresentadas neste texto se baseiam na análise da configuração textual do documento Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2015a, 301 p.), disponível para receber críticas, comentários, sugestões e propostas, por meio da plataforma “consulta pública”, no Portal MEC. Com o objetivo de fundamentar meu posicionamento contrário a essa BNCC (com destaque para aspectos relativos ao componente curricular Língua Portuguesa, em especial alfabetização), a análise é conduzida pela problematização do que considero ser a contradição de base que inviabiliza a efetivação, de forma coerente e consequente, de sua finalidade de se constituir, com “força de lei”, como concretização de anseios históricos para a educação brasileira. De forma complementar, evidencia-se a equivocada identificação, por parte das autoridades do MEC, entre o “amplo debate” proposto e a “consulta pública” em curso. Possivelmente, a contradição mencionada esteja também, de forma direta ou indireta, na base dos muitíssimos posicionamentos críticos sobre a BNCC sistematizados e divulgados por respeitados educadores e entidades científicas e educacionais, assim como dos muitos comentários críticos que têm circulado em diferentes mídias impressas e eletrônicas como também entre pesquisadores e professores. Para a maioria destes, as críticas ao documento são sintetizadas principalmente na classificação desqualificativa “colcha de retalhos”, em referência ao seu sentido figurado corrente: ajuntamento de partes desconexas ou incoerentes entre si, que resultam num todo desfigurado e sem sentido. Partilho de muitos desses posicionamentos críticos, embora com discordâncias em relação a alguns dos argumentos neles apresentados e, em especial, à classificação mencionada. Além de não dar conta da complexidade dos problemas do documento em análise, essa classificação tende a desqualificar aquela técnica artesanal, que, embora pareça “simples” e “desconexa”, envolve sofisticados processos de planejamento e execução, o que não se verifica na BNCC apresentada pelo MEC. Por meio da expressão "configuração textual", busco nomear o conjunto de aspectos constitutivos de determinado texto, os quais se referem: às opções temático-conteudísticas (o quê?) e estruturais-formais (como?), projetadas por um determinado sujeito (quem?), que se apresenta como autor de um discurso produzido de determinado ponto de vista e lugar social (de onde?) e momento histórico (quando?), movido por certas necessidades (por quê?) e propósitos (para quê?), visando a determinado efeito em determinado tipo de leitor (para quem?) e logrando determinado tipo de circulação, utilização e repercussão.[1] É, portanto, a análise integrada desses aspectos que propicia reconhecer e interrogar determinado texto [e] dele produzir uma leitura possível e autorizada, a partir de seus próprios objetivos, necessidades e interesses. (MORTATTI, 2000, p. 31) Inicialmente previsto para o dia 15/12/2015, o prazo para consulta pública foi estendido para 15/03/2016. Alguns trechos deste texto foram utilizados nos documentos sobre a BNCC, para os quais contribuí e que foram elaborados pela Comissão de Ensino da FFC e pela Pró-Reitoria de Graduação da UNESP, tendo sido encaminhados ao MEC por meio da plataforma mencionada.