Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2021)
LINFOMA ANAPLÁSICO ASSOCIADO A PRÓTESE MAMÁRIA: UM RISCO REAL
Abstract
Z.L, feminina, 57 anos, com antecedente de dislipidemia e asma controlada, realizou implante de prótese mamária de silicone de superfície texturizada bilateral em 2003. Em 2017 sofreu trauma em mama E, apresentando seroma local, autolimitado. Em 26/04/19, quando realizou troca de prótese bilateral, evoluiu com seroma em mama E recorrente. Punção de seroma e análise de líquido detectou proliferação de células grandes e fenótipo anormal (CD30+, HLA-DR+ e CD25+), sugestivo de linfoma anaplásico associado à prótese mamária (LAGC-PM). Em 02/02/2021 submeteu-se retirada de próteses e a análise histopatológica e imunohistoquímica concluiu diagnóstico como Linfoma Anaplásico de células T (CD30+ / AlK-1 neg). O estadiamento foi Ann Arbor I e a cirurgia foi considerada curativa. O PET-CT inicial em 24/03/2021 demonstrou hipermetabolismo em área de densificação difusa nos planos profundos da mama E (SUV 4,4) e ausência de outras lesões hipermetabólicas suspeitas. Em novo PET-CT de controle, 3 meses e 22 dias após a cirurgia, constatou-se área de densificação difusa nos planos profundos da mama E, acoplada a musculatura peitoral, sem hipermetabolismo. Optado por seguimento e reavaliação clínica, laboratorial e de imagem em 3 meses. O LAGC-PM é um tipo raro de linfoma não-Hodgkin, que ganhou destaque em 2008, quando Roden et al. descreveram 4 casos de distúrbio linfoproliferativo de células T CD30+ relacionados a implantes mamários. Até 2019, de acordo com o FDA, foram relatados 573 casos pelo mundo, com 33 mortes associadas. A apresentação clínica mais comum do LAGC-PM é um derrame ao redor do implante, ocorrendo em cerca de dois terços das pacientes e, utilizando o sistema de estadiamento Ann Arbor tradicional, ao diagnóstico, 83% das pacientes com esta entidade apresentam doença em estágio I, 10% em II e 7% em IV. Outra forma de apresentação é uma massa tumoral, com ou sem efusão, geralmente percebida como uma área endurecida com crescimento progressivo ao longo das superfícies medial ou lateral do implante. Da implantação até o diagnóstico, relatos descrevem uma faixa de 2 até 32 anos, com intervalo médio de 8–9 anos. A patogênese não é bem definida, mas sabe-se que a inflamação crônica secundária à estimulação antigênica leva ao recrutamento, proliferação e expansão das células T, à expansão clonal e, eventualmente, à transformação maligna. Acredita-se que a superfície do implante se degrada com o tempo, resultando no vazamento de antígenos que induzem uma resposta imune do hospedeiro, fenômeno este que é mais pronunciado em implantes texturizados, Quanto ao tratamento, os melhores resultados são alcançados pela capsulectomia total com remoção de implantes e todas as evidências de doença. Esta abordagem leva à remissão completa em 93% dos casos com derrame na ausência de massa e 72% se uma massa também estava presente. A quimioterapia é reservada para os casos irressecáveis e em estadiamentos avançados, devendo ser individualizada. O LAGC-PM é uma doença rara, reconhecida recentemente pela OMS e com fisiopatologia pouco compreendida. Considerando que a realização de cirurgias estéticas e reparadoras, como os implantes mamários, são cada vez mais comuns, relatos de casos são importantes para conscientização, reconhecimento e, ainda, para discussão do diagnóstico e tratamento precoce.