Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL NAS DOENÇAS HEMATOLÓGICAS – SÍNDROME LINFOPROLIFERATIVA AUTOIMUNE
Abstract
Introdução: O diagnóstico diferencial das doenças hematológicas pode ser um grande desafio. As doenças autoimunes constituem parte importante desse diferencial, sendo rastreadas com frequência nas doenças hematológicas como um todo. Múltiplas biópsias, terapias empíricas, internações prolongadas e desgaste físico e emocional do paciente e da equipe são obstáculos presentes em casos mais complexos. A Síndrome Linfoproliferativa Autoimune (ALPS) participa desses diferenciais, com poucos marcadores alvo e não disponíveis de maneira ampla, costuma ainda ser pouco lembrada. Uma clínica inespecífica de astenia, linfonodomegalias e esplenomegalia como principais queixas iniciais. Citopenias de múltiplas linhagens acompanham. Relato de caso: Paciente feminina, 26 anos, previamente hígida, encaminhada após extensa investigação em outro serviço por quadro de linfonodomegalias, predominância em região cervical bilateral, a maior medindo 24 x 10 mm, associada a hepatoesplenomegalia, com perda ponderal superior a 10 kg em 6 meses, além de úlceras orais dolorosas, dificultando a alimentação. Laboratorialmente possuía leucopenia grave, com 53 neutrófilos por mm3, e anemia com hemoglobina de 8,1 g/dL (normocrômica e normocítica), sorologias virais para HIV, Hepatites, Mononucleose e Citomegalovírus negativas. Sífilis, toxoplasmose e leishmaniose também negativas. Perfil carencial com vitamina B12 de 359 pg/mL. Nos exames de imagem realizados previamente, que incluíam tomografias e ultrassonografias, possuía linfonodomegalias em cadeias cervicais bilaterais, bem como hepatoesplenomegalia homogênea. Havia sido submetida a 3 biópsias de medula óssea com mielograma e imunofenotipagem, 2 biópsias excisionais de linfonodos (ambas com laudo final indicando reacional), esplenectomia e exposição a múltiplos esquemas de antibioticoterapia por quadros infecciosos. Exames prévios a esplenectomia indicavam presença de plaquetopenia grave. Em revisão de biópsias de nossa unidade, o aspecto reacional benigno dos linfonodos foi mantido. Agora apresentava hepatomegalia grave, 15 cm abaixo do rebordo costal direito, causando dor abdominal e náuseas frequentes. Seguindo investigação, já possuía FAN e demais pesquisas autoimunes negativas. Na imunofenotipagem foi confirmada a presença de células T duplo-negativas características da doença, que, em conjunto com o quadro não maligno e não infeccioso, mantido por período superior a 6 meses, concluem o diagnóstico de ALPS. A paciente foi submetida a tratamento com prednisona 1 mg/kg, com excelente resposta, com a contagem de neutrófilos indo de 134 para 2851 mm3 em 3 semanas. A hemoglobina foi de 7,1 para 13 g/dL, com transfusão de 1 concentrado de hemácias na data da primeira aferição, no mesmo período. Houve ganho de peso de mais de 10 kg. Atualmente retomou suas atividades laborais e foi realizado ajuste da terapia com micofenolato de mofetila 1.500 mg a cada 12 horas, com retirada completa do corticoide e manutenção da excelente resposta. Conclusão: A síndrome ALPS é um diagnóstico raro e de investigação pouco frequente. Conforme previsto na literatura, até 50% dos pacientes passam por esplenectomia antes do diagnóstico final, fato ocorrido com a paciente, dada a raridade do diagnóstico e da esplenomegalia associada a plaquetopenia no início do quadro. A excelente resposta ao tratamento de primeira linha, bem como a presença da típica população duplo negativa corrobora com o padrão da doença. Acompanhamento conjunto com a equipe de reumatologia e desmame precoce de corticoides são boas práticas para um cuidado adequado com a paciente. Quando disponíveis, as pesquisas genéticas trazem força ao diagnóstico e permitem identificação de risco, visto caráter familiar também estar presente.