Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2023)
AUSÊNCIA DA MUTAÇÃO DA JAK 2 V617F EM UM CASO DE POLICITEMIA VERA
Abstract
Introdução: A policitemia vera (PV) é uma neoplasia mieloproliferativa crônica caracterizada pela proliferação clonal anômala do sistema hematopoiético, ocasionando a proliferação intensa das células das linhagens granulocítica, megacariocítica e principalmente eritrocítica. É uma doença rara (2:100.000) que acomete principalmente adultos, mais frequente em homens mais idosos. A mutação JAK2V617F está presente em mais de 97% dos indivíduos com PV. Os sinais e sintomas ocorrem devido ao aumento da volemia, viscosidade e frequentemente ocorrem tromboses antes do diagnóstico. A hiperviscosidade pode levar à hipertensão arterial (HA), cefaléia, insuficiência cardíaca, e a proliferação de mastócitos à prurido e úlceras gastroduodenais. Causas secundárias de poliglobulia devem ser excluídas (eritropoetina elevada) e o diagnóstico é clínico-laboratorial. Segundo a OMS, os principais critérios diagnósticos são: biópsia de medula óssea com hipercelularidade para idade com panmielose, mutação da JAK2V617F ou outra mutação de função semelhante, e aumento do volume eritrocitário (pode incluir hemoglobina >16,5 g/dL ou hematócrito >49% para o sexo masculino, e hemoglobina (Hb) >16 g/dL ou hematócrito (Ht) >48% para o sexo feminino). Como critério menor se enquadra o nível sérico de eritropoetina (EPO) subnormal. Desse modo, para diagnóstico definitivo é necessário o preenchimento de todos os critérios principais ou dois dos critérios maiores e um critério menor. Há controvérsias em relação a EPO, uma vez que há casos em que a ela pode estar normal em condições de hipoxemia associada, como devido a tabagismo, apneia obstrutiva do sono, doença pulmonar crônica e/ou obesidade concomitantemente à PV. O tratamento visa corrigir o hematócrito (<45%) e leucócitos (<10.000/mm3), além de utilizar antiagregante plaquetário, a fim de se prevenir eventos trombóticos.Os principais tratamentos são sangrias terapêuticas, hidroxicarbamida e em alguns casos interferon e o ruxolitinibe. Material e Método: Estudo descritivo fundamentado na análise do prontuário da paciente e revisão da literatura. Relato de caso: Homem, 60 anos, branco, em 2006 foi encaminhado ao ambulatório de hematologia por apresentar hematócrito elevado sendo excluídas causas secundárias (pulmonares, cardiovasculares, tumor renal). Aos exames laboratoriais: biópsia de medula óssea hipercelular, compatível com doença mieloproliferativa crônica, mutação de JAK2V617F negativa, cariótipo 46XY, Hb 17 g/dL, Ht 52%, EPO 17,8 mUI/mL. Foi identificado HAS e gota. Tratado com sangrias terapêuticas por 21 vezes desde 2006 sem o uso de hidroxicarbamida. Atualmente sem queixas, Hb de 12,2 g/dL e Ht de 40,2%. Discussão e Conclusão: A PV é uma doença mieloproliferativa crônica rara, por vezes de difícil diagnóstico, quando não preenche os critérios, sendo este realizado através de exclusão de outras causas. O caso mostra um homem que possui dois critérios maiores para diagnóstico de PV, além de apresentar uma EPO normal. Há a possibilidade de alguma hipoxemia junto com a PV que manteria a eritropoetina em níveis normais, embora limítrofes. Desse modo, acreditamos ser este caso, um caso incomum de PV com ausência de mutação da JAK 2 V617F. O tratamento com sangrias tem possivelmente prevenido a ocorrência de eventos trombóticos há cerca de 17 anos, ou seja, desde o diagnóstico.