Intexto (Sep 2019)
Realismo Grotesco e Carnalidade: Inspirações Bakhtinianas em Estudos de Games
Abstract
O objetivo deste artigo é reformular a crítica dos retratos do corpo humano e das interações humanas básicas em jogos digitais tendo em conta a teoria do carnavalesco e do realismo grotesco de Mikhail Bakthtin. De acordo com o estudioso russo, a segunda é a convenção estética dominante da primeira, facilitando a representação da essência do carnaval (entendido como visão de mundo, não como festival). Meu argumento é que várias deformações grotescas do corpo em jogos de videogame mainstream e de orçamento alto, como protagonistas masculinos muito musculosos, mulheres hipersexualizadas e inimigos hediondos ou inumanos, assim como a estranha obsessão em produzir cenários fotorrealistas, se configuram firmemente dentro dessa estética. O mesmo se aplica ao corpo fragmentado, incompleto do protagonista em perspectiva de primeira pessoa. O imaginário é ainda mais reforçado pela maneira comum que games AAA1 lidam com interação humana, pois tendem a reduzir qualquer contato a várias colisões de corpos, jogando qualquer outra convenção social – mesmo uma simples conversa – para fora do terreno do gameplay ou reduzindo-a drasticamente. A mais importante colisão desse tipo é, claro, o combate frequente de natureza violenta excessiva. As lutas conjuram importantes aspectos do carnavalesco: humilhação ritual e o desmantelamento de hierarquias – representadas pela clara estratificação de antagonistas, variando em força e perigo que apresentam ao protagonista – reduzindo-as a sua carnalidade. Esse modo de interpretação abre mais perspectivas em consideração à questão da importância social de jogos de videogame violentos como possíveis veículos de expressão de oposição a ordens políticas e éticas estáticas.
Keywords