Cena (Apr 2023)
Longe demais dos capitais: critérios de avaliação de projetos culturais e políticas públicas
Abstract
O setor cultural, compreendido como um campo específico (BOURDIEU, 1983), é caracterizado pela complexidade, diversidade e multiplicidade de formas e expressões. No contexto brasileiro, a atuação de trabalhadoras e trabalhadores da cultura é caracterizada, em grande parte, pela informalidade e intermitência (SILVA e ZIVIANI, 2021), associadas também à precariedade, crise e desestruturação (PRADO, 2017). Em paralelo, a política cultural brasileira vem, desde o período de redemocratização política, abordando "gestão cultural" como "fomento à cultura" (FERNANDES, 2019), deixando consideráveis lacunas na estruturação da política pública para o setor, regulamentada por legislações, planos e conferências consolidadas atualmente através do Sistema Nacional de Cultura (SNC) ainda não devidamente implementado em todo o território nacional. Busca-se - a partir da Sociologia Reflexiva de Pierre Bourdieu (1930-2002) - compreender as tensões evidenciadas durante a avaliação de projetos inscritos no Prêmio Trajetórias Culturais - Griô Sirley Amaro, instrumento de aplicação da Lei de Emergência Cultural 14017/2020, popularizada como Lei Aldir Blanc. É traçado, também, breve comparativo com outras instâncias de avaliação cultural, tais como a Lei de Incentivo à Cultura (LIC-RS), o Edital FAC Artes de Espetáculo e o Edital Banrisul Virtual (Música). Identifica-se que persiste a falta de nitidez conceitual na configuração e valorização de trajetórias culturais, sobretudo na compatibilização entre os princípios e prioridades indicadas na legislação e a avaliação de projetos, agentes, trajetórias e produções. A partir da pesquisa de doutorado envolvendo a articulação das categorias “campo”, “capital” e “habitus” (BOURDIEU, 1977; 1993) propõem-se indicadores para a identificação de mecanismos de posicionamento, legitimação, reputação e consagração de trajetórias culturais no contexto do enfrentamento do racismo estrutural e da exclusão, com vistas a novos paradigmas que contemplem as especificidades do trabalho artístico e sua interface com ações afirmativas e políticas sociais inclusivas da diversidade de fazeres culturais, agentes, manifestações e expressões do mosaico cultural brasileiro.