Revista Brasileira de Educação Especial (Mar 2013)
O brincar de uma criança autista sob a ótica da perspectiva histórico-cultural An autistic child's play from the cultural-historical perspective
Abstract
perspectivas tradicionais acreditam que dentre as características do autismo infantil está a incapacidade ou grande dificuldade destas crianças desenvolverem atividades de brincar. No entanto, assumindo a perspectiva histórico-cultural de desenvolvimento humano - que compreende os sujeitos enquanto seres sociais, constituídos culturalmente, na e pela linguagem - esta afirmação deixa de ser sustentável, uma vez que brincar é uma atividade constituída socialmente. Considerando isto, este estudo tem como objetivo analisar as peculiaridades do brincar de uma criança com autismo infantil, imersa em ricas experiências com outras crianças, com brinquedos e com brincadeiras. A coleta de dados ocorreu a partir de gravações em vídeo de sessões de terapia fonoaudiológica com um grupo de quatro crianças autistas. O enfoque será para as brincadeiras de uma delas, S1 de quatro anos. As gravações foram transcritas e as análises dos dados regidas pela perspectiva da análise microgenética. Os dados mostram que é possível para a criança autista, quando vivenciando interações sociais favoráveis, desenvolver o brincar, os processos imaginativos e as sequencias de ações observadas no grupo social e no uso cultural dos brinquedos. Conclui-se que é fundamental a intervenção do terapeuta durante o processo de interação, atribuindo significações às ações da criança, proporcionando a ela a possibilidade de constituir-se como um ser cultural e de interagir com o outro e, dessa forma, construir as bases para as internalizações que daí decorrerão. Observa-se também que as experiências vivenciadas fora da instituição possibilitam oportunidades de brincar e desenvolver-se durante as brincadeiras, mesmo que de forma mais lenta e específica.Traditional perspectives consider that among the characteristics of autism is the inability or great difficulty these children have for engaging in play activities. However, assuming the historical-cultural perspective of human development - which conceives of subjects as social beings, culturally constituted in and through language - this statement is no longer sustainable, since play is a socially constituted activity. From this standpoint, this study aimed to analyze the peculiarities of play in a child with autism, immersed in rich experiences with other children, with toys and games. Data collection was carried out using video recordings of speech therapy sessions with a group of four autistic children. The focus was on one child's play activities (S1, four years). The recordings were transcribed and data was analyzed based on the microgenetic analysis perspective. The data showed that when autistic children experience positive social interactions, it is possible to develop play, imaginative processes and sequences of actions such as those observed in the group's social and cultural use of toys. We conclude that therapist intervention is critical during the interaction process, assigning meanings to the child's actions, enabling the possibility of constitution of cultural being and of interacting with others. This process helps build the basis for internalizations derived from playing with others. As observed, experiences outside the institution provided opportunities to play and develop during the process, albeit more slowly and more specifically.