Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
ABORDAGEM DIAGNÓSTICA DE HEMORRAGIA GRAVE EM IDOSO: RELATO DE CASO DE HEMOFILIA A ADQUIRIDA
Abstract
Introdução: Hemofilia A adquirida é uma doença hemorrágica autoimune, caracterizada pela presença de inibidor adquirido do fator VIII. Apresenta incidência bimodal, acometendo idosos (mediana de 74 anos) e mulheres em idade fértil. Pode haver associação com doenças neoplásicas, autoimunes e medicamentos, mas em torno de 50% são casos idiopáticos. Cerca de 90% dos casos cursam com manifestações hemorrágicas ao diagnóstico, geralmente espontâneas e graves, sendo os principais sítios de sangramento: pele, tecido subcutâneo, músculo e trato gastrointestinal. No contexto laboratorial, nota-se o prolongamento isolado do TTPa (Tempo de Tromboplastina Parcial ativado), sem correção no teste da mistura. O tratamento consiste em erradicação do inibidor com imunossupressão (corticoides, rituximabe, ciclofosfamida) e uso de agentes hemostáticos de bypass, em caso de sangramento clinicamente relevante. Objetivos: Apresentar caso de hemofilia A adquirida como causa de sangramento grave adquirido em idoso, ressaltando a importância de analisar cuidadosamente os testes de triagem da coagulação. Relato do caso: Homem, 67 anos, hipertenso, admitido devido a sangramento em sítio de punção arterial realizada, havia um mês, durante cateterismo, indicado para investigação de dor precordial. O sangramento era controlado com curativo compressivo, mas retornava quando retirada a compressão, mesmo após a suspensão de rivaroxabana, usada desde evento trombótico venoso espontâneo em membro inferior esquerdo, ocorrido havia 6 meses. Paciente apresentava anemia na admissão, com hemoglobina de 9,7 g/dL evoluindo com queda para 8,1 g/dL após 12 horas. Notava-se prolongamento do TTPa, com relação de 2,81, e TAP dentro da normalidade. Doppler arterial detectou pseudoaneurisma no sítio de punção da artéria radial, com controle do sangramento e estabilização de níveis hematimétricos após arteriorrafia. Apesar disso, o paciente manteve TTPa prolongado não justificado. Em investigação, foram solicitados anticorpos antifosfolípides (anticardiolipina, anti-beta2glicoproteína I e anticoagulante lúpico), com resultados dentro da normalidade, atividade do fator VIII, com valor de 1% e inibidor do FVIII de 10,72 UB/mL, confirmando o diagnóstico de hemofilia A adquirida. Paciente tratado com prednisona 1 mg/Kg/dia, sem necessidade de agente hemostático de bypass devido resolução completa do sangramento. Rastreio para neoplasias sem alterações. Após 6 semanas de terapia imunossupressora, paciente apresentava atividade do FVIII de 68% e inibidor de 0,8 UB/mL, sendo iniciada a retirada gradual do corticoide. Na 17ª semana, paciente sem corticoide, com atividade de FVIII de 144% é inibidor de 0,23 UB/mL. Discussão: Em contexto de TTPa isoladamente prolongado, o teste da mistura na abordagem inicial seria relevante. Na ausência de correção do TTPa, deve-se considerar a presença de inibidor de fator, de anticoagulante lúpico ou da atividade de anticoagulantes (heparina e anticoagulantes orais diretos). Conclusão: Ressaltamos, neste relato de sangramento grave adquirido em idoso, a importância da análise cuidadosa dos testes laboratoriais de triagem. No caso de TTPa isoladamente prolongado, a hipótese de hemofilia A adquirida deve ser considerada e investigada detalhadamente.