Revista Direito e Justiça (Jun 2017)

PARA ALÉM DA “VAQUEJADA” E DA “FARRA DO BOI”: JUSTIÇA PARA O DIREITO DOS ANIMAIS

  • Fernando César Costa Xavier

DOI
https://doi.org/10.31512/rdj.v17i28.2172
Journal volume & issue
Vol. 17, no. 28
pp. 267 – 278

Abstract

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É errado afirmar que a decisão do Supremo Tribunal Federal no caso “Vaquejada” (ou mesmo nos casos “Farra do Boi” ou sobre rinhas de galo) seria um reforço nos precedentes de um suposto reconhecimento dos direitos dos animais na jurisdição constitucional brasileira. Nesses casos todos, a maioria dos Ministros que atuaram como julgadores ponderou e afirmou a prevalência do direito ambiental, incluindo nele a proteção da fauna (e a não submissão dos animais à crueldade), nos termos do art. 225, § 1º, VII, da Constituição brasileira. Teria sido, assim, desconsiderada a diferença categorial existente entre o direito ambiental e os direitos dos animais. A própria Constituição estimula a confusão entre essas categorias ao tratar da proibição da crueldade contra animais em um capítulo sobre meio ambiente (cap. VI). Este artigo sustenta que, ao se concentrar na afirmação do direito ambiental, o STF permite que sejam fortalecidos argumentos considerados empecilhos para os defensores dos direitos dos animais, em especial o argumento antropocêntrico de que o meio ambiente equilibrado é importante à medida que possibilita aos seres humanos mais qualidade de vida. Analisando os votos, principalmente nos casos da Vaquejada e da Farra do Boi, verifica-se que pontos muitos importantes analisados no debate teórico sobre direitos dos animais, como as noções de “dignidade animal” e “vida em florescimento”, são totalmente negligenciados. O artigo se serve amplamente dos argumentos apresentados por Martha Nussbaum no seu texto Beyond “Compassion and humanity”: Justice for Nonhuman Animals, sobretudo para mostrar que a abordagem das “capabilidades” por ela desenvolvida pode fornecer uma orientação teórica melhor do que as abordagens do contratualismo kantiano e do utilitarismo para a questão de direitos dos animais, principalmente porque é capaz de reconhecer a amplitude da noção de “dignidade animal”. Considera-se que o ponto central a ser enfrentado, para fins do reconhecimento dos direitos dos animais, é aquele suscitado pela Alta Corte de Kerala no caso Nair v. União da Índia, de junho 2000, que Nussbaum destaca como epígrafe do seu texto citado: “Portanto, não é apenas nosso dever fundamental demonstrar compaixão para com os nossos amigos animais, mas também reconhecer e proteger seus direitos [...] Se os seres humanos têm direito a direitos fundamentais, por que não os têm os animais?”.