Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
DOENÇA DA CRIOAGLUTININA – DA BANCADA AO TRATAMENTO
Abstract
Objetivo: Relatar um caso de paciente portadora de doença da crioaglutinina (CAD), desde o diagnóstico imunohematológico até seu tratamento. Relato do caso: Trata-se de paciente de 79 anos, que se apresentou ao serviço de Hematologia para investigação de Tromboembolismo pulmonar (TEP) não provocado em Dezembro de 2021. Durante a propedêutica, foi identificada anemia moderada (Hemoglobina ao redor de 8 g/dL), sendo aprofundada sua avaliação. No ínterim das consultas, internou em Setembro de 2022 com queda importante da contagem de hemoglobina (4 g/dL) em vigência de parotidite bacteriana aguda. Tratada com antibióticos, obtendo melhora do quadro. Neste momento, as provas de hemólise mostraram-se positivas, o que motivou a solicitação de Teste da antiglobulina direto (TAD), o qual foi fortemente positivo (4+). Os estudos imunohematológicos demonstraram fixação exclusiva de C3d no cartão monoespecífico, pesquisa de anticorpos irregulares (PAI) negativa a 37°C e fortemente reativa a 4°C (4+ em ambas as células). A titulação da crioaglutinina foi > 1:64 e havia especificidade anti I (testada contra hemácias de cordão umbilical). Diante da anemia hemolítica por anticorpos frios, a investigação de causas secundárias foi negativa (sorologias virais, provas de autoimunidade e neoplasmas linfoproliferativos). A biópsia de medula óssea excluiu outras entidades linfoproliferativas. Firmado diagnóstico de CAD, sendo iniciado tratamento com esquema Rituximab + Bendamustina, seis ciclos, até maio/2023. No seguimento, a paciente vem em uma resposta parcial tardia, porém progressiva, de sua doença, com redução dos parâmetros de hemólise e melhora hematimétrica. Discussão: A CAD é uma doença hemolítica rara causada por autoanticorpos frios e ainda pouco conhecida. Geralmente com especificidade anti I e com titulação da crioaglutinina acima de 1:64 como critério diagnóstico obrigatório. Deve ser sempre diferenciada das Síndrome da crioaglutinina, em que há uma causa secundária subjacente – doenças autoimunes, neoplasmas linfoproliferativos ou quadros infecciosos agudos / crônicos. Na avaliação de medula óssea atenta, é possível achar infiltração por clone linfocitário específico da doença, já descrito na classificação atualizada de neoplasias hematológicas da OMS 2022. Além disso, pela hiperviscosidade, há risco aumentado de eventos tromboembólicos, como foi o caso da paciente. Essa entidade não responde a corticosteroides, devendo ser tratada com imunoquimioterapia para erradicação do clone em questão. O esquema mais comumente usado é Rituximab + Bendamustina, com ótimas taxas de resposta. O tempo de resposta é variável, sendo relatadas respostas após doze a dezoito meses inclusive, como foi o caso da paciente em questão. Após o tratamento, houve grande ganho da qualidade de vida e melhora laboratorial. Conclusão: A raridade e o diagnóstico complexo fazem com que essa doença seja, ainda hoje, subdiagnosticada em nosso meio. Somente o reconhecimento precoce dessa grave entidade, por hematologistas e hemoterapeutas, poderá possibilitar o seu manejo correto e o consequente sucesso no tratamento.