Hematology, Transfusion and Cell Therapy (Oct 2024)
SÉRIE DE CASOS DE TOXICIDADE CARDÍACA PÓS-USO DE ANTRACICLINA EM PACIENTES COM LEUCEMIA PROMIELOCÍTICA TRATADOS PELO SUS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UFSC (JULHO 2022 - JULHO 2024)
Abstract
Introdução: A leucemia promielocítica (LPA) é uma forma de leucemia aguda, caracterizada pela t(15;17) e fusão dos genes PML-RARA. Após a instituição do tratamento adequado, possui altas taxas de cura. O tratamento padrão nos países em desenvolvimento inclui ácido all-transretinoico (ATRA) e antraciclinas, que, apesar de sua eficácia, estão associadas a um risco de cardiotoxicidade. Objetivo: Relatar uma série de casos de toxicidade cardíaca em pacientes com LPA tratados com protocolo IC APL 2006 disponível pelo Sistema Único de Saúde no período de julho de 2022 a 2024. Relato dos Casos: Paciente 1: Feminino, 32 anos, risco intermediário, hígida, recebendo dose total de 500 mg/m2 de Daunorrubicina e 30 mg/m2 de Mitoxantrone. Evoluiu com disfunção cardíaca com queda da fração de ejeção após quatro meses do término da manutenção. Paciente 2: Masculino, 29 anos, alto risco, hígido, recebendo dose total de 400 mg/m2 de Daunorrubicina e 50 mg/m2 de Mitoxantrone. Evoluiu com perimiocardite durante a fase de indução e disfunção ventricular esquerda (VE), 15 meses após indução. Paciente 3: Feminino, 34 anos, alto risco, hipertensa. Evoluiu com insuficiência cardíaca (IC) e disfunção de VE sete meses após indução. Paciente 4: Masculino, 22 anos, risco intermediário, tabagista. Evoluiu com queda da fração de ejeção e disfunção VE, 15 meses após indução. Paciente 5: Feminino, 52 anos, risco intermediário, hipertensa e obesa. Evoluiu com queda da fração de ejeção e disfunção VE grave após terceira consolidação. Paciente 6: Feminino, 17 anos, risco intermediário, sobrepeso G1. Evoluiu com insuficiência cardíaca grave 5 meses após término da indução. Discussão: Durante o período, foram atendidos 19 pacientes com LPA. Destes, 6 pacientes (31,6%) desenvolveram algum grau de cardiotoxicidade durante e/ ou após o tratamento com antraciclina. A taxa de cardiotoxicidade observada está acima da literatura, que documenta uma incidência variando entre 9% e 26%, dependendo da dose cumulativa (400-550 mg/m2) e dos fatores de risco individuais dos pacientes. A cardiotoxicidade pode manifestar-se de várias formas, incluindo disfunção ventricular, insuficiência cardíaca congestiva e arritmias. Os fatores de risco para cardiotoxicidade incluem dose cumulativa de antraciclinas, idade avançada, presença de comorbidadee e predisposição genética. O manejo envolve estratégias preventivas, diagnóstico precoce e tratamento adequado. A monitorização cardíaca regular com ecocardiogramas e biomarcadores, como troponinas e peptídeo natriurético tipo B, é essencial para a detecção precoce de disfunção cardíaca. Além disso, intervenções como o uso de cardioprotetores (por exemplo, dexrazoxano), a modificação de dose e a administração de medicamentos (inibidores enzima conversora de angiotensina, betabloqueadores) têm mostrado eficácia na mitigação dos efeitos cardíacos. Os achados desta série de casos ressaltam a necessidade de vigilância e manejo proativo em pacientes tratados com antraciclinas, inclusive após o término da terapia. Implementar protocolos de monitorização cardíaca mais rigorosos podem ajudar a identificar a cardiotoxicidade em estágios iniciais, permitindo intervenções mais eficazes. Estudos futuros devem focar em identificar biomarcadores e desenvolver terapias que possam prevenir a cardiotoxicidade sem comprometer a eficácia das antraciclinas. Conclusão: A alta incidência de cardiotoxicidade observada em nossa série sublinha a importância da integração do oncologista e cardiologista na equipe para otimizar a abordagem terapêutica e reduzir o impacto das complicações cardiovasculares, contribuindo para uma melhor qualidade de vida e sobrevida dos pacientes.